Entendendo um pouco melhor as representações do Senador Fernando Collor contra o Procurador Geral da República Roberto Gurgel.
Collor conseguiu que o Senado aprovasse requerimento ao Tribunal de
Contas da União, para auditoria no Ministério Público Federal, devido à
compra de iPADS no último dia do ano.
Com isso, o requerimento passará à frente de todos os demais processos do TCU.
Não há indícios de corrupção na compra. Gurgel aproveitou a verba
disponível no último dia do ano para uma compra às pressas de iPAD.
Ocorre em muitos órgãos de governo, porque o dinheiro não gasto no ano
acaba devolvido ao orçamento.
Mas formalmente atropelou-se a Lei das Licitações. O MPF queria o
iPAD. Em vez de definir claramente, montou uma licitação de tablets e
direcionou (através das especificações técnicas) para o iPAD.
O que se indaga é se, caso esse procedimento tivesse sido adotado por
algum prefeito ou chefe de repartição, em uma licitação feita às
pressas no último dia do ano, qual teria sido a atitude do MPF? Provavelmente abriria um inquérito.
Portanto, a denúncia sobre a licitação visa expor dois pesos e duas medidas no órgão.
A questão central são as demais representações de Collor contra Gurgel.
Nos últimos anos, Gurgel reteve em suas mãos e de sua esposa grande
parte das denúncias contra pessoas com foro privilegiado - políticos no
exercício do mandato. Acumulou um poder potencial enorme. Há indícios de
que utilizou politicamente uma atribuição do cargo.
Permanece em suspenso o pedido de convocação para prestar
esclarecimentos ao Senado, em relação à acusação de ter prevaricado no
caso Demóstenes Torres. Gurgel segurou a denúncia, não arquivando nem
dando encaminhamento. E conseguiu o apoio de Demóstenes Torres –
historicamente seu adversário – para sua recondução ao cargo de PGR.
O pedido de investigação contra Gurgel está sob análise do jurídico
do Senado. Depois, ele encaminhará seu parecer à mesa. Se a mesa aprovar
o processo de investigação, Gurgel terá que se afastar imediatamente da
PGR.
Como o pedido foi apresentado no ano passado, antes da eleição da
atual mesa diretora, o presidente Renan Calheiros não poderá ser acusado
de retaliação contra Gurgel. Mas poderá ser acusado de prevaricar, caso
não encaminhe o pedido para votação.
De fato, depois do caso Demóstenes, surgiu o caso Renan Calheiros,
novo presidente do Senado. Gurgel segurou por dois anos a denúncia
contra Renan, também obteve dele o apoio para sua recondução ao cargo.
Uma semana antes das eleições para a mesa do Senado, entrou com o
denúncia. No dia da votação, vazou o inquérito – que estava sob segredo
de Justiça – para a revista Época - visando beneficiar o outro
candidato, Senador (e procurador da República) Pedro Taques.
Mais tarde, apareceu o caso Aécio Neves. Sabe-se, agora, que há 23
meses Gurgel mantem na gaveta denúncia contra Aécio: nem arquiva, nem dá
seguimento. Mantém na gaveta.
Finalmente, na semana passada surgiu o caso envolvendo o próprio
Pedro Taques. Enquanto procurador, foi denunciado por suposto benefício à
chamada máfia dos combustíveis de Mato Grosso. Eleito senador, a
denúncia foi encaminhada a Gurgel, que até hoje não tomou nenhuma
providência: nem arquivando, nem dando seguimento.
Na denúncia, Collor não requereu do PGR – com base na Lei da
Transparência – informações sobre outros inquéritos de pessoas com foro
privilegiado que ele mantém engavetados. E não requereu provavelmente
para não constranger colegas e enfraquecer as representações contra
Gurgel. Pelo número provável de processos engavetados, é possível que
Gurgel tenha nas mãos parte expressiva do Senado. Só o líder do PMDB no
Senado, Eunício de Oliveira, tem duas denúncias dormindo nas gavetas de
Gurgel.
Esse jogo político comprometeu a imagem do próprio Ministério Público
Federal. No período do “mensalão”, Gurgel recebeu blindagem da
corporação em função da guerra santa em curso. E, no Senado, não
prosperaram as tentativas de Collor de convoca-lo, justamente devido ao
risco potencial de ele desengavetar as denúncias.
Os episódios seguintes acabaram desnudando seu ativismo político. Não
conta mais com o apoio fechado da organização. Quando os ventos do
corporativismo se dissiparem um pouco, o MPF verá que esse jogo político
de Gurgel comprometeu a imagem da organização muito mais do que as
estripulias de um Luiz Francisco. Mostrou uma dificuldade interna enorme
de promover a auto-regulação através do Conselho Nacional do Ministério
Público.
Mesmo assim, na próxima semana provavelmente o Senado irá confirmar a
indicação do procurador Luiz Moreira para o Conselho Nacional do
Ministério Público (CNMP). Atribui-se a Gurgel forte pressão para que os
senadores vetassem a indicação. Moreira chegou a ser alvo de dossiês
publicados na mídia.
Blog do Luis Nassif
Nenhum comentário:
Postar um comentário