publicado em 29 de novembro de 2013 às 18:20
Quem lida com pesquisa de opinião vê o aumento de eleitores que dizem odiar algo ou tudo na política
por Marcos Coimbra, em CartaCapital, encaminhada via e-mail por Julio Cesar Macedo Amorim
A figura de Joaquim
Barbosa faz mal à cultura política brasileira. Muito já se falou a
respeito de como o atual presidente do Supremo conduziu o julgamento da
Ação Penal 470, a que trata do “mensalão”. Salvo os antipetistas
radicais, que ficaram encantados com seu comportamento e o endeusaram, a
maioria dos comentaristas o criticou.
Ao longo do processo,
Barbosa nunca foi julgador, mas acusador. Desde a fase inicial, parecia
considerar-se imbuído da missão de condenar e castigar os envolvidos a
penas “exemplares”, como se estivesse no cumprimento de um desígnio de
Deus. Nunca mostrou ter a dúvida necessária à aplicação equilibrada da
lei. Ao contrário, revelou-se um homem de certezas inabaláveis, o pior
tipo de magistrado.
Passou dos limites em seu
desejo de vingança. Legitimou evidências tênues e admitiu provas
amplamente questionáveis contra os acusados, inovou em matéria jurídica
para prejudicá-los, foi criativo no estabelecimento de uma
processualística que inibisse a defesa, usou as prerrogativas de relator
do processo para constranger seus pares, aproveitou-se dos vínculos com
grande parte da mídia para acuar quem o confrontasse.
Agora, depois da prisão
dos condenados, foi ao extremo de destituir o juiz responsável pela
execução das penas: parece achá-lo leniente. Queria dureza.
Barbosa é exemplo de algo
inaceitável na democracia: o juiz que acha suficientes suas convicções.
Que justifica sua ação por pretensa superioridade moral em relação aos
outros. E que, ao se comportar dessa forma, autoriza qualquer um pegar o
porrete (desde que se acredite “certo”).
Sua figura é negativa, também, por um segundo motivo.
Pense em ser candidato a
Presidente da República ou não, Barbosa é um autêntico expoente de algo
que cresceu nos últimos anos e que pode se tornar um grave problema em
nossa sociedade: o sentimento de ódio na política.
Quem lida com pesquisas
de opinião, particularmente as qualitativas, vê avolumar-se o contigente
de eleitores que mostram odiar alguma coisa ou tudo na política. Não a
simples desaprovação ou rejeição, o desgostar de alguém ou de um
partido. Mas o ódio.
É fácil constatar a
difusão do fenômeno na internet, particularmente nas redes sociais. Nas
postagens a respeito do cotidiano da política, por exemplo sobre a
prisão dos condenados no “mensalão”, a linguagem de muitos expressa
intenso rancor: vontade de matar, destruir, exterminar. E o mais
extraordinário é que esses indivíduos não estranham suas emoções, acham
normal a violência.
Não se espantam, pois
veem sentimentos iguais na televisão, leem editorialistas e
comentaristas que se orgulham da boçalidade. Os odientos na sociedade
reproduzem o ódio que consomem.
Isso não fazia parte
relevante de nossa cultura política até outro dia. Certamente houve, mas
não foi típico o ódio contra os militares na ditadura. Havia rejeição a
José Sarney, mas ninguém queria matá-lo. Fernando Collor subiu e caiu
sem ser odiado (talvez, apenas no confisco da poupança). Fernando
Henrique Cardoso terminou seu governo reprovado por nove entre 10
brasileiros, enfrentou oposição, mas não a cólera de hoje.
O ódio que um pedaço da
oposição sente atualmente nasce de onde? Da aversão (irracional) às
mudanças que nossa sociedade experimentou de Lula para cá? Do temor
(racional) que Dilma Rousseff vença a eleição de 2014? Da estupidez de
acreditar que nasceram agora os problemas (como a corrupção) que
inexistiam (ou eram “pequenos”)? Da necessidade de macaquear os
porta-vozes do conservadorismo (como acontece com qualquer modismo)?
Barbosa é um dos
principais responsáveis por essa onda que só faz crescer. Consolidou-se
nesse posto nada honroso ao oferecer ao País o espetáculo do avião com
os condenados do “mensalão” rumo a Brasília no dia 15 de novembro.
Exibiu-o apenas para alimentar o ódio de alguns.
A terceira razão é que
inventou para si uma imagem nociva à democracia. O papel que encena, de
justiceiro implacável e ferrabrás dos corruptos, é profundamente
antipedagógico.
Em um país tão marcado
pelo personalismo, Barbosa apresenta-se como “encarnação do bem”, mais
um santarrão que vem de fora da política para limpá-la. Serve apenas
para confirmar equívocos autoritários e deseducar a respeito da vida
democrática.
Viomundo
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