Da mesma forma que a perícia apresentada ontem por
quatro cardiologistas da Câmara sobre o estado de saúde de José Genoino
"se anuncia uma melhoria no paciente, aponta-se para um risco de piora
grave", escreve o colunista da IstoÉ; objetivo do laudo, diz ele, é
sugerir a "simulação de uma doença que não seria tão grave assim. Como
se tudo fosse fingimento, encenação"
247 - O laudo apresentado ontem pela junta
médica da Câmara sobre o estado de saúde do deputado licenciado José
Genoino foi dado pela metade, segundo o colunista da IstoÉ Paulo Moreira
Leite. A perícia, feita por quatro cardiologistas, esconde que o quadro
do parlamentar, hoje em recuperação, pode ser revertido e apresentar
uma piora. O objetivo com esse tipo de documento, diz PML, é sugerir a
"simulação de uma doença que não seria tão grave assim. Como se tudo
fosse fingimento, encenação". Leia seu artigo:
UM LAUDO PELA METADE
Divulgação resumida do laudo da Câmara deixou de lado o principal
Todo cuidado é pouco nestes tempos em que até laudos médicos parecem capazes de falar duas coisas ao mesmo tempo.
A versão resumida do laudo médico da Câmara sobre a saúde de José
Genoíno, divulgada quarta-feira pelos meios de comunicação, não exibe o
parágrafo mais importante do documento.
Limita-se a dizer que Genoíno não pode ser enquadrado hoje, na
categoria de quem sofre de uma cardiopatia grave, condição médica
precisa.
Também informa que os quatro peritos que assinam o laudo recomendam
que, no final de sua licença médica de 120 dias, que se encerra em
janeiro de 2014, Genoíno receba uma nova licença, de 90 dias, para em
seguida ser submetido a uma nova avaliação. Fica a pergunta: se está
tudo tão bem com sua saúde, por que não dizem que é hora de voltar ao
trabalho?
A realidade é a seguinte: ao dar preferência à versão resumida do laudo, omitiu-se, é claro, o aspecto mais importante.
Embora se considere que Genoíno esteja recuperado, três meses depois
de ter sofrido um implante de 15 cm em sua artéria aorta, é grande a
possibilidade de que essa situação seja revertida, em função,
exatamente, de sua atividade laboral, como diz o laudo. O trecho omitido
explica por que isso pode acontecer:
a) em função da idade de Genoíno;
b) a presença de um fenômeno chamado falsa luz na aorta;
c) o diâmetro do arco aórtico de 41 mm;
d) o controle inadequado da pressão arterial;
b) a presença de um fenômeno chamado falsa luz na aorta;
c) o diâmetro do arco aórtico de 41 mm;
d) o controle inadequado da pressão arterial;
"Nessa circunstancia," diz o documento, no longo trecho omitido, "a
atividade laboral poderia acarretar riscos de descontrole de pressão
arterial que, em associação com anticoagulação inadequada, aumentaria o
risco de eventos cardíacos e cerebrais. "
É disso que estamos falando, portanto. De um paciente de 67 anos, que
tem um quadro de saúde delicado, capaz de evoluir para um infarto ou
AVC – sinônimos de "eventos cardíacos e cerebrais" – em função de
fatores desfavoráveis, que a medicina pode tentar controlar mas não pode
curar.
Mais uma vez, estamos de volta a condicionantes. Ou salvaguardas, como diz o laudo dos cardiologistas da Unb.
Como principal fator de risco, diz o trecho não divulgado do laudo, encontra-se sua "atividade laboral."
Da mesma forma que se anuncia uma melhoria no paciente, aponta-se para um risco de piora grave.
Por esse motivo, prevê-se uma licença de 90 dias, seguida de nova avaliação.
E nada se diz diante da hipótese de que ele seja obrigado a deixar a prisão domiciliar e retornar ao presídio da Papuda.
Não se trata de uma questão médica, apenas. Genoíno já é aposentado pela Câmara.
Mas luta pela aposentadoria por invalidez porque sua condição médica se modificou e tem direito a ela.
Era um cidadão saudável, até julho. Enfrenta aquele conjunto de
riscos permanentes que você pode ler acima, sem falar no implante de 15
cm no peito, agora. É claro que ele não irá acumular duas
aposentadorias. Uma exclui a outra. Há uma vantagem na aposentadoria por
invalidez, relativa aos gastos com tratamento médico.
Mas há uma questão política, também. Condenado pela ação penal 470, Genoíno enfrenta o debate sobre a cassação do mandato.
Querem que seja atingido pela desonra.
É um político convencido da própria inocência, o que não é difícil de
compreender. Havia uma única prova que havia contra ele, aqueles
contratos do PT com o Banco Rural. Mas ela foi desmontada pelo inquérito
da Polícia Federal, que demonstrou que eram transações comerciais
legítimas, que mobilizavam dinheiro de verdade, ao contrário do que se
disse no início das denúncias.
Num país em que tantos políticos parecem convencidos de que "o mal,
em nosso tempo, tem uma atração mórbida," como dizia Hanna Arendt,
referindo-se ao pensamento nazista, Genoíno tornou-se um troféu para
seus adversários. Deve ser perseguido, estigmatizado, humilhado, se
possível.
Já que é um dos poucos políticos que não enriqueceu na atividade,
querem derrotar sua dignidade, esterilizar uma biografia que poucos
podem igualar. Precisa ser criminalizado, num recurso destinado a apagar
sua luta corajosa durante o regime militar, a atuação essencial na
Assembléia Constituinte, o respeito absoluto pela democracia.
Essa é a função da divulgação dos laudos pela metade, atitude que
sugerem que simula uma doença que não seria tão grave assim. Como se
tudo fosse fingimento, encenação.
Mas, como sempre fez, Genoíno resiste.
Brasil 247
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