sab, 21/09/2013
Roberto Gurgel foi um desastre para a imagem do Ministério Público e
faz parte da mesma falta de discernimento que levou à indicação de Dias
Toffoli, Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Luiz Fux. No caso de Gurgel,
referendado por uma corporação que exigia dele apenas isenção na
política interna do órgão e o equilíbrio na distribuição de poderes
internos. E que, por um vácuo de referenciais não cuidou de pensar na
imagem e na legitimação externa do MPF.
Não se entendia que a voz e o rosto do Ministério Público Federal é
do Procurador Geral da República. Todo o trabalho da base, as inúmeras
bandeiras sociais, ambientais, as grandes personalidades internas do MPF
só agora ganham alguma visibilidade, porque soterradas pela
mediocridade e parcialidade gritantes de Gurgel.
A eleição de Rodrigo Janot traz um novo alento. E é importante entender o contraponto feito pela blogosfera.
O estilo Gurgel
O estilo de Gurgel tinha defeitos gritantes, uma parcialidade
insuportável para quem exerce um cargo público que, por definição, não
lhe pertence. O envolvimento emocional com a AP 470 chocava o meio
jurídico, os próprios colegas, qualquer pessoa dotada de um mínimo de
discernimento.
Mas havia blindagens de toda ordem, fruto do espírito de linchamento
criado pela mídia no episódio e seguido por oportunistas ou pessoas sem
brio e respeito pelo Judiciário.
Internamente, no MPF, o corporativismo falava mais alto.
Externamente, no meio judiciário, cautela e discrição impediam a crítica
explícita. Mais que isso, não havia nenhum espaço na velha mídia para
qualquer tipo de crítica que colocasse um freio às arbitrariedades de
Gurgel, porque ele comia em sua mão. Ele se tornou uma criatura da
campanha midiática.
Repondo o MPF nos trilhos
A entrevista de Janot a Felipe Racondo e Andreza Natais, do Estado de
São Paulo, expõe de maneira claríssima as principais críticas ao ex-PGR
e devolve ao cargo a postura que se exige de um Procurador Geral.
Janot não cometeu nenhuma liberalidade, nenhum corte nas tradições.
Apenas, sem mencionar expressamente o antecessor – nem era o caso -
reconheceu os desvios de conduta da PGR e expôs de maneira simples qual
deve ser o papel de um PGR.
É aí que entra a blogosfera. A velha mídia abdicou de seu papel de
freio e contrapeso, de crítico de costumes e de arbítrios, do exercício
do pluralismo, para abraçar a selvageria da guerra de extermínio, sem
permitir nenhum contraponto. As críticas contra Gurgel ganharam espaço
porque existiu a alternativa da blogosfera e das redes sociais. E muitos
procuradores, juristas, advogados, público bem informado souberam
diferenciar o esperneio e as guerrilhas políticas das críticas
consistentes.
Em sua entrevista, Janot diz o óbvio, mas o óbvio, nesses tempos de
devassidão tornou-se matéria prima tão escassa que tem que ser saudado.
O que é o óbvio:
Sobre a isonomia
Tem que haver isonomia nos julgamentos. “Pau que dá em Chico dá em
Francisco”, diz ele, referindo-se ao mensalão mineiro. Jamais defendi
que a isonomia se obtém no desrespeito aos direitos de todos os réus.
Preferia, em ambos os casos, o julgamento severo mas respeitando
direitos individuais.
Sobre o “processo da vida” do procurador
Quem tem “processo da vida” é advogado. Para qualquer juiz e para o Ministério Público, todo processo é importante.
Sobre a prisão imediata dos acusados
A gana de Gurgel em propor a prisão imediata dos réus deixava claro
tratar-se ou de vingança – pelos ataques que sofreu -, ou intenções
políticas, ou o espírito do linchador que aflorou quando teve respaldo
da velha mídia.
Não havia lógica nessa insistência na prisão imediata, a não ser
atender aos clamores da turba. O processo liquidou com a carreira
política de lideranças expressivas, certamente vai levar vários à
prisão, é apenas questão de tempo. A troco de quê a mesquinharia do
chute na pessoa caída, a insistência na prisão imediata? A atuação de
Gurgel foi indigna, ao se entregar a essa orgia de sangue desnecessária.
Janot repõe a serenidade ao MPF. Para quem não terá segundo
julgamento, a prisão é decorrente. Para quem terá um segundo, haverá de
se aguardar o acórdão. Na parte que lhe compete, será o mais rápido
possível para completar a sua parte. Simples assim.
Sobre o “marco contra a impunidade”
Janot é objetivo: não é um grande marco, não é uma exceção e não
representa o fim da impunidade. Vinte anos atrás não haveria um processo
desses, porque o país ainda não era totalmente republicano.
Sobre as gavetas fechadas da PGR
Abre caminho para corrigir uma das maiores vergonhas da PGR: a
gaveta, podendo ser aberta ou fechada de acordo com a vontade única do
PGR. “Vou dar maior transparência às questões que tramitam no gabinete
do procurador-geral. A sociedade brasileira tem direito de saber o que
tem aqui dentro, como tramitam os processos e os prazos. Eu quero abrir o
gabinete. Minha segunda meta é acabar com os processos que ficam na
prateleira. O acervo é a massa do diabo. Não podemos ter medo de
arquivar e de judicializar”.
Sobre a marca que quer deixar
Os repórteres provocam, sobre a imagem de engavetador-geral de outros
procuradores e indagam qual a marca que deseja deixar. E Janot: a da
simplicidade. De fato, o exercício sério e responsável do poder exige
isso: simplicidade, clareza, não-deslumbramento.
Ainda é cedo para avaliações mais consistentes. Mas o início fo promissor,, sem jactâncias e sem medo..
Blog do Luis Nassif
Nenhum comentário:
Postar um comentário