Nestes últimos meses vimos a direita recuperar o dom da palavra. Em 2002
ela se apavorara com a perspectiva da eleição de um presidente
socialista. O medo foi tanto e contaminou de tal forma os mercados
financeiros internacionais que levou o governo FHC a uma segunda crise
de balanço de pagamentos.
O novo presidente, entretanto, logo afastou os medos dos ricos que então
perceberam que não seriam expropriados. Pelo contrário, viram um
governo procurando fazer um pacto político com os empresários
industriais e que não hostilizava a coalizão política de grandes e
médios rentistas e dos financistas.
Por outro lado, o novo governo de esquerda pareceu haver logrado retomar
o crescimento econômico, ao mesmo tempo que adotava uma politica firme
de distribuição de renda. Na verdade, beneficiava-se de um grande
aumento nos preços das commodities exportadas pelo país, e da
possibilidade (que aproveitou de forma equivocada) de apreciar a moeda
nacional que se depreciara na crise de 2002.
Lula terminou seu governo com aprovação popular recorde, e com a direita
brasileira sem discurso. Deixou, porém, para sua sucessora, a
presidente Dilma, uma taxa de câmbio incrivelmente sobreapreciada, que,
depois de haver roubado das empresas brasileiras o mercado externo,
agora (desde 2011) negava-lhes acesso ao próprio mercado interno.
Sem surpresa, os resultados econômicos dos dois primeiros anos de
governo foram decepcionantes. E, no seu segundo ano, foram combinados
com o julgamento do mensalão pelo STF, transformado em grande evento
político e midiático.
Com isto o governo se enfraqueceu, e a direita brasileira recuperou a
voz. Mas uma voz vazia, liberal e moralista. Liberal porque pretende que
a solução dos problemas é liberalizar os mercados ainda mais, não
obstante os maus resultados que geraram. Moralista porque adotou um
discurso de condenação moral de todos os políticos, tratando-os de forma
desrespeitosa, ao mesmo tempo que continuava a apoiar em voz baixa os
partidos de direita.
Quando, devido às manifestações de junho, os índices de aprovação da
presidente caíram, a direita comemorou. Não percebeu que caíam também os
índices de aprovação de todos os governadores. Nem se deu conta de que a
presidente logo recuperaria parte do apoio perdido.
Quando o STF afinal garantiu a doze dos condenados do mensalão um novo
julgamento de alguns pontos, essa direita novamente se indignou. Agora
era a justiça que também era corrupta.
Quando o deputado José Genoino (condenado nesse processo porque era
presidente do PT quando as irregularidades aconteceram) manifestou o
quanto vinha sofrendo com tudo isso -ele que, de fato, sempre dedicou a
sua vida ao país, e hoje é um homem pobre-, essa direita limitou-se a
gritar que o Brasil era o reino da impunidade, em vez de perceber que o
castigo que Genoino já teve foi provavelmente maior do que sua culpa.
Os países democráticos precisam de uma direita conservadora e de uma
esquerda progressista. Mas cada uma deve ter um discurso que faça
sentido, em vez do mero moralismo que a direita vem exibindo.
Luiz Carlos Bresser-Pereira é professor emérito da Fundação
Getúlio Vargas, onde ensina economia, teoria política e teoria social. É
presidente do Centro de Economia Política e editor da "Revista de
Economia Política" desde 2001. Foi ministro da Fazenda, da Administração
e Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia. Escreve a cada duas
semanas, aos domingos, na versão impressa de "Mundo".
Folha de S. Paulo
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