Fantasma do passado:
Em 7 de março de 2002, o jornal Estadão noticiava "Subsidiária da Petrobras na Argentina tem prejuízo de R$ 790 milhões". Da notícia tratada com discrição (e inexplicavelmente escondida no caderno "cidades") extraímos as informações e complementamos:
Em dezembro de 2001 a Argentina estava quebrada, implantando o "curralito", ou seja, o confisco da poupança e depósitos bancários, semelhante ao Plano Collor no Brasil.
Nem precisa desenhar que quem estava com investimentos na Argentina queria sair, como a Repsol que não tinha perspectivas de obter retorno lucrativo na refinaria de Bahia Blanca. E quem não estava com dinheiro investido lá nem pensava em entrar. Menos a diretoria tucana da Petrobras, naquele governo FHC/PSDB/Aécio.
No mesmo mês de dezembro de 2001, os tucanos fecharam o negócio da troca da refinaria e postos na Argentina da Repsol por parte da REFAP (Refinaria Alberto Pasqualini, no Rio Grande do Sul) e postos no Brasil, no mesmo pacote.
Um presentão de mãe para filho aos espanhóis donos da Repsol.
Menos de um mês depois, em janeiro de 2002, a Petrobras já contabilizava o prejuízo na refinaria Argentina de R$ 790 milhões em dinheiro da época, pela desvalorização do peso frente ao dólar (coisa que era mais do que prevista e anunciada, na época).
O peso argentino valia US$ 1,15 em dezembro de 2001 e disparou para US$ 1,95 em janeiro de 2002.
Corrigindo o valor do prejuízo da Petrobras de apenas um mês na Argentina para valores de hoje (2014) dá R$ 2 bilhões (pelo IGP-M).
A Repsol se deu bem em cima dos cofres públicos da Petrobras, quando era administrada pelos tucanos. A REFAP deu lucro líquido de R$ 190 milhões em 2001.
O prejuízo total das perdas do patrimônio cedido no Brasil pode chegar a bem mais do que isso. Fala-se até em US$ 2,5 bilhões.
Detalhe curioso: a troca da refinaria foi fechada três dias antes do então presidente da Petrobras Henri Phillipe Reischstul, escolhido por FHC, deixar o cargo.
Qual a diferença deste caso com o caso Cacciolla? Em ambos os casos teve uma operação cambial lesiva ao erário. No caso Cacciolla foi com o Banco Central que "comprou" o rombo com dinheiro público. No caso da Repsol foi a Petrobras que "comprou" o prejuízo anunciado da Repsol.
Hoje (27) a CPI da Petrobras aprovou por unanimidade requerimento pedindo as cópias de processos em análise no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que tratam da troca dessa suposta negociata.
Isso explica porque o senador Aécio Neves (PSDB-MG) passou a fugir do assunto Petrobras, e não passa nem na porta da sala da CPI.
Eis a notícia do Estadão em 2002:
Quinta-feira, 7 de Março de 2002, 17:43
Subsidiária da Petrobras na Argentina tem prejuízo de R$ 790 milhões
A subsidiária da Petrobras na Argentina, a EG3, adquirida da Repsol-YPF no final do ano passado por meio de troca de ativos, teve um prejuízo de R$ 790 milhões com a desvalorização do peso em relação ao dólar. Esse valor foi apurado pela conversão do peso para o dólar ao câmbio de 1,70 (US$ 1 = 1,70 pesos), que foi a cotação registrada no dia 11 de janeiro e consta nas notas explicativas anexas ao balanço da Downstream Participações S.A., empresa criada pela Petrobras e que passou a controlar a Refinaria Alberto Pasqualini, no Rio Grande do Sul, e a própria EG3.
Consultada pela Agência Estado sobre a subsidiária argentina, a Petrobras informou que não poderia fazer comentários porque toda a negociação está protegida por cláusulas contratuais.
As notas explicativas da Downstream informam que as perdas da subsidiária não afetarão a Petrobras porque foram feitas provisões prevendo as perdas no valor de R$ 818 milhões. Não fica claro, porém, se a pesificação está nesse limite de proteção pois a desvalorização do peso só ocorreu em janeiro, após o encerramento do exercício de 2001. Não há informações contábeis sobre os onze primeiros meses da EG3 no ano passado e as notas explicativas da Downstream detalham apenas que a EG3 teve lucro de R$ 2,45 milhões em dezembro.
A operação de troca de ativos entre a Petrobras e a Repsol-YPF durou mais de 12 meses de negociação e foi concluída no 17 de dezembro pelo ex-presidente da estatal Henri Phillipe Reischstul (três dias antes da sua exoneração). Alguns detalhes só se tornaram públicos com a divulgação do balanço da Downstream. Para tornar viável a operação, a Petrobras criou três empresas, transformando a Refinaria Alberto Pasqualini numa empresa independente, a Refap S.A..
Além disso, criou a Downstream Participações (99,99% da própria Petrobras e 0,01% da Petrobras Distribuidora), que passou a controlar 100% da Refap S.A . Foi então criada uma outra empresa, a Refisol - para a qual foram transferidos 30% da Refap. A Refisol, por sua vez, foi transferida para a Repsol-YPF, que, desta forma, passou a ser dona de 30% da antiga Refinaria Alberto Pasqualini, empresa que teve faturamento líquido de R$ 3 bilhões em 2001, com lucro líquido de R$ 190 milhões.
A subsidiária Downstream permaneceu como titular de 70% da Refap S.A. e ficou com 67,5% da empresa chamada 5283 Participações S.A, que antes pertencia à Repsol-YPF e é a controladora da EG3. A própria Petrobras ficou com os 32,5% restantes da 5283. Além de uma refinaria em Baia Blanca, com capacidade de processar 30 mil barris/dia, o que representa cerca de 16% da refinaria gaúcha, a EG3 controla "cerca de" 700 postos de vendas de combustíveis no país vizinho (a nota da Downstream não informa a quantidade precisa), além de fábrica de asfalto e lubrificantes.
A Repsol, além dos 30% da Refap, ficou com "direitos contratuais" para instalar 234 postos de abastecimento no Brasil nas regiões Sul e Sudeste e 10% do poço Albacora Leste, na Bacia de Campos, com reservas de 1,3 bilhão de barris de petróleo, cuja produção atingirá 175 mil barris/dia a partir de 2006. Ou seja, a Repsol trocou o "risco Argentina" pelo "risco Brasil", enquanto a Petrobras fez operação inversa, optando por fazer investimentos no país vizinho, especialmente na área de distribuição.
Quando anunciou a operação de troca de ativos, a Petrobras assegurou que a operação era "neutra", com os ativos sendo avaliados em torno de US$ 500 milhões para cada lado. A Petrobras não divulgou o laudo de avaliação dos ativos envolvidos e nem dos indicadores referentes à performance dos postos na Argentina ou da refinaria de Baia Blanca envolvidos na transação.
No balanço da Downstream há a informação de que a Refinaria Alberto Pasqualini foi avaliada por R$ 460 milhões, o que representa menos de US$ 200 milhões ao câmbio atual. Esse valor pode ser inferido da avaliação feita pela Petrobras para os 30% envolvidos na transação, estimados em R$ 137,7 milhões.
Além de participação de 30% na refinaria gaúcha, a Repsol recebeu ainda outros ativos da Petrobras, tais como os direitos contratuais para receber combustíveis de 234 postos de revenda a serem instalados nas regiões Sul e Sudeste brasileiros 10% do poço de Albacora Leste, situado na bacia de Campos (com reservas provadas de 1,3 bilhão de barris de petróleo e produção de 175 mil barris por dia a partir de 2006).
Além disso, a Petrobras assumiu outros compromissos, inclusive um empréstimo de US$ 677 milhões no Japan Bank for International Cooperation (Jbic) para a ampliação da refinaria gaúcha de 125 mil barris/dia para 189 mil barris dia (os sites da Petrobras e da própria Repsol afirmam que a capacidade atual da refinaria já é de 189 mil barris dia). Esse empréstimo será pago posteriormente (em data não definida) pela própria Refap (e não pela Repsol). Todos os passivos trabalhistas, inclusive os referentes ao fundo de pensão dos trabalhadores da Refap, foram transferidos para a Petrobras.
Por: Zé Augusto
Rede Brasil Atual - Blog da Helena
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