O cardeal panamenho Óscar Maradiego tem toda razão em seu desabafo. É uma vergonha a desigualdade social que teima em açoitar a America Latina.
Temo que meus filhos viverão num Brasil abjetamente iníquo, e pior: temo que os filhos dos meus filhos também.
Lamento por meus netos e netas. Terão que viajar para a Escandinávia para ver uma sociedade justa, digna, decente.
O pobre vota, vota, vota – e permanece pobre.
Há na America Latina um sistema sinistro pelo qual os privilegiados dão sempre um jeito de manter suas vantagens. Eles são intocáveis. Os Sarneys, por exemplo. Ninguém mexe com eles porque Sarney, em algum momento, teria sido importante para Lula.
É uma divida de Lula, se ela existe de fato. Ou do PT. Mas acaba transferida para todos os brasileiros, em especial os miseráveis maranhenses. A elite latino-americana armou um esquema pelo qual nada muda, ou muito pouco muda.
O fato é que o PT não conseguiu romper este esquema – ou por medo, ou por pragmatismo, ou simplesmente por inépcia. A falta de audácia, para mim, foi o principal fator do imobilismo, o que é curioso num partido que pregava que a esperança deveria vencer o medo.
No poder, o medo venceu.
O Brasil ainda está à espera de seu Papa Francisco – um destemido, um visionário, um inovador que mexe nas coisas sem ficar se perguntando se os americanos vão gostar, ou os tradicionalistas da Igreja, ou quem seja. Só assim você muda as coisas: incomodando. Ah, os católicos ricos americanos estão amuados porque Francisco elogiou marxistas que conheceu? Francisco é mais elegante do que o que vou escrever, mas a resposta dele foi: danem-se.
Clap, clap, clap. De pé.
É dentro desse quadro que aparecem os rolezinhos. Uma entrevista do Estadão com o organizador do primeiro grande rolezinho é reveladora.
O que eles queriam, os jovens da periferia?
Queriam ver alguma coisa que não existe na região em que moram: a opulência segregadora dos shoppings, no qual eles só são bem-vindos para servir a clientela depois de ficar mais de uma hora num ou dois ônibus lotados para chegar ao trabalho.
Nós não cuidamos da periferia. Brigamos quando alguém tenta fazer alguma coisa pela periferia. O melhor exemplo é o prefeito Haddad, massacrado por tentar diminuir o imposto das regiões mais pobres e aumentar o das áreas mais ricas. Os privilegiados se uniram em Sao Paulo, e ainda receberam o apoio de Joaquim Barbosa.
A periferia só é vista quando vai para o centro.
Então assusta, e a policia é chamada, e os alarmes soam histéricos: pobres e negros à vista. Queremos empurrá-los de volta para o lugar precário de onde jamais deveriam ter saído para nos incomodar.
Que venham, mas ordenadamente, para lavar os nossos pratos, servir a nossa comida, fazer a faxina de casa e sorrir submissamente.
O cardeal tem razão. É muita conversa e quase nenhuma ação na América Latina, a terra dos intocáveis, o paraíso da iniquidade.
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