Jornalista Jânio de Freitas rebate a defesa do
presidente do STF, Joaquim Barbosa, no caso do pedido de quebra de
sigilo telefônico da área dos prédios dos Três Poderes para investigação
do suposto uso de celular pelo ex-ministro José Dirceu; Jânio comenta
resposta enviada pelo STF ao artigo que produziu na semana passada, em
que levanta questões sobre a atuação de Barbosa no caso
247 - O jornalista Jânio de Freitas rebate, em
artigo publicado neste domingo (20) na Folha, a defesa do presidente do
Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, no caso do
pedido de quebra de sigilo telefônico da área que envolve o Palácio do
Planalto, do Senado, da Câmara e do próprio STF para investigação do
suposto uso de celular pelo ex-ministro José Dirceu, encarcerado no
Presídio da Papuda desde novembro passado.
Jânio comenta resposta enviada pela assessoria do presidente do STF
ao artigo que produziu na semana passada, em que levanta questionamentos
sobre a atuação de Barbosa no caso. E rebate cada ponto da defesa do
ministro.
Confira abaixo:
Passos fora do Painel
O Painel do Leitor, localização nobre que a Folha destina às
contestações, críticas e outras considerações sobre o que publicou, não
foi visto pelo secretário de comunicação do Supremo Tribunal Federal,
Wellington Geraldo Silva, como apropriado a uma nota sua para desejada
defesa do ministro Joaquim Barbosa. Em exaltada cobrança telefônica há
uma semana, no domingo passado, indagou "que espaço temos para
responder?". Por mim, todo o de que eu possa dispor, sem com isto
diminuir meu apreço pelo sentido democrático do Painel do Leitor.
A nota é a propósito do artigo "Nos passos de Obama", do domingo,
13.abr.14, sobre o uso ardiloso de coordenadas geográficas pela
promotora Márcia Milhomens Sirotheau Corrêa para pedir quebra de sigilos
telefônicos que, a pretexto de verificar alegado telefonema de José
Dirceu na Papuda, violaria também as comunicações de todos os celulares
do Planalto. Soube-se, no decorrer da semana, que também os sigilos de
celulares do Senado, da Câmara e do próprio Supremo Tribunal Federal
cairiam, na violação pretendida.
Passados cinco dias do artigo, na sexta, 18, diz a nota: "Na coluna
de 13.4.2014, que trata de pedido formulado ao Supremo Tribunal Federal
pelo Ministério Público do DF à Vara de Execuções Penais de Brasília, o
ministro Joaquim Barbosa é acusado de participação em um ato criminoso,
qual seja a quebra ilegal de sigilo telefônico. Sem que o ministro tenha
sido ouvido, são feitas afirmações sobre a conduta dele, tais como: É
interessante que o juiz da Vara de Execuções Penais e o ministro Joaquim
Barbosa não dessem sinal algum de estranheza...' (...) A alternativa a
essa indiferença seria o conhecimento prévio, por ambos, da
artimanha...'. São acusações graves, desprovidas, porém, de amparo na
realidade dos fatos".
Segue: "Uma simples consulta ao andamento do processo --que é
público, diga-se-- permitiria ao senhor e a qualquer pessoa interessada
verificar todos os procedimentos adotados pelo presidente do STF. Nessa
consulta, seria possível concluir que a primeira providência adotada foi
o envio do pedido para manifestação da Procuradoria-Geral da República.
Só após esse parecer é que o ministro estará habilitado a analisar
todos os aspectos envolvidos no pedido, e então tomar uma decisão. Isso é
o que manda a lei. Todos esses procedimentos também teriam sido
informados caso o presidente do STF tivesse a oportunidade de ser ouvido
antes da publicação da sua coluna. O fato é que ainda não houve nenhuma
manifestação do ministro Joaquim Barbosa sobre o pedido formulado pelo
Ministério Público do Distrito Federal".
Por fim: "Esclarecemos ainda que o Supremo Tribunal Federal atua
dentro dos parâmetros da Constituição Brasileira [sic] na AP 470 e em
todas as [sic] milhares de Ações que julga. Portanto, refutamos qualquer
insinuação sobre a legalidade dos procedimentos adotados pelo
tribunal".
Transcrevo o parágrafo de onde a nota pinçou dois pedaços de frases, e
deu-lhes reticências sugestivas, mas inexistentes no artigo:
"É também interessante que o juiz da Vara de Execuções Penais e o
ministro Joaquim Barbosa não dessem sinal algum de estranheza --sem
falarmos nas providências legais necessárias-- ao deparar-se com
coordenadas geográficas de latitude e longitude para pedir quebra de
sigilo telefônico de números, endereços e portadores de celulares não
citados. A alternativa a essa indiferença seria o conhecimento prévio,
por ambos, da artimanha e do alcance da alegada identificação de
telefonema no presídio da Papuda."
O juiz e o ministro deram algum "sinal de estranheza" ante o ofício
com anormal uso de coordenadas, em vez de números telefônicos e nomes,
sem qualquer explicação para isso? Não. Logo, a frase não contém
acusação, referindo-se a um fato real e não negado. Fato que a mim, e a
outros de semelhante reação, nada proíbe de achar interessante.
A outra "acusação grave". O artigo diz que a alternativa SERIA,
condicional, não diz que foi, nem o insinua. Para quem a lê sem
presunção, o que a frase diz é que o juiz e o ministro só não estariam
faltando com a atenção merecida pelo ato anormal do ofício, e razão
bastante de estranheza, em caso de terem conhecimento prévio da
artimanha. Não os acusa de o terem.
O acusado passo a ser eu. A nota me acusa, em referência a Joaquim
Barbosa, de o haver "acusado de participação em um ato criminoso". A
nota faz uma afirmação inverdadeira. E reiterada.
Quanto à afirmação de que ao ministro cabe receber e mandar ofício ao
procurador-geral da República, para só depois opinar, é esquecer duas
obviedades. Primeira: o ministro tem a autoridade e o dever de examinar
cada ofício recebido e lhe dar o encaminhamento adequado, sendo um deles
a rejeição por impropriedade. Segunda: o oposto disso é reduzir
ministro do Supremo a tarefas de estafeta, entregador de papéis de um
lado para outro, como sugere a nota.
Aproveito a ocasião para um acréscimo nesse caso das coordenadas. O
pedido de quebra dos sigilos foi encaminhado ao presidente do Supremo em
28 de março, quando o juiz que o encaminhou já se dissera impedido de
atuar no processo, por "motivos de foro íntimo", e sua transferência já
estava determinada pelo Tribunal de Justiça.
Brasil 247
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