seg, 21/04/2014 - 12:53
- Atualizado em 21/04/2014 - 12:56
Enviado por Stanley Burburinho
Matéria de Amaury Jr, autor do livro A Privataria Tucana, na IstoÉ
de 2003: Doleiro Youssef operou com Ricardo Sérgio que foi caixa das
campanhas de FHC e Serra.
Investigações revelam que o ex-caixa de campanha do PSDB movimentou US$ 56 milhões por intermédio de contas no Banestado dos EUA
Por Amaury Ribeiro Jr.
Documentos a que ISTOÉ teve acesso começam a esclarecer por que o laudo de exame financeiro nº 675/2002, elaborado pelos peritos criminais da PF Renato Rodrigues Barbosa, Eurico Montenegro e Emanuel Coelho, ficou engavetado nos últimos seis meses do governo FHC, quando a instituição era comandada por Agílio Monteiro e Itanor Carneiro. Nas 1.057 páginas que detalham todas as remessas feitas por doleiros por intermédio da agência do banco Banestado em Nova York está documentado o caminho que o caixa de campanha de FHC e do então candidato José Serra, Ricardo Sérgio Oliveira, usou para enviar US$ 56 milhões ao Exterior entre 1996 e 1997. O laudo dos peritos mostra que, nas suas operações, o tesoureiro utilizava o doleiro Alberto Youssef, também contratado por Fernandinho Beira-Mar para remeter dinheiro sujo do narcotráfico para o Exterior. Os peritos descobriram que todo o dinheiro enviado por Ricardo Sérgio ia parar na camuflada conta número 310035, no banco Chase Manhattan também em Nova York (hoje JP Morgan Chase), batizada com o intrigante nome “Tucano”. De acordo com documentos obtidos por ISTOÉ, em apenas dois dias – 15 e 16 de outubro de 1996 – a Tucano recebeu US$ 1,5 milhão. A papelada reunida pelos peritos indica que o nome dado à conta não é uma casualidade.
Os dois responsáveis pela administração da dinheirama, segundo a
perícia, são figurinhas carimbadas nos principais escândalos envolvendo o
processo de privatização das teles e auxiliares diretos de Ricardo
Sérgio: João Bosco Madeiro da Costa, ex-diretor da Previ (o fundo de
pensão do Banco do Brasil) e ex-assessor do caixa tucano na diretoria
internacional do BB, e o advogado americano David Spencer. A perícia
revela ainda que Spencer é procurador de Ricardo Sérgio em vários
paraísos fiscais. Ao perseguir a trilha do dinheiro, os peritos
descobriram que os milhões de Ricardo Sérgio deixavam o País por
intermédio de uma rede de laranjas paraguaios e uruguaios contratados
por Youssef e eram depositados na conta 1461-9, na agência do Banestado
em Nova York antes de pousar na emplumada Tucano, que contava com uma
proteção especial para dificultar sua localização. Ela estava registrada
dentro de outra conta no Chase em nome da empresa Beacon Hill Service
Corporation. De lá, o dinheiro era distribuído para contas de Ricardo
Sérgio e de João Bosco em paraísos fiscais no Caribe.
A perícia traz outras provas contundentes. A PF conseguiu comprovar
que parte do dinheiro enviado por intermédio do Banestado retornou ao
Brasil para concretizar negócios desse mesmo grupo. Segundo o laudo, o
dinheiro voltava embarcado em uma conta-ônibus junto com recursos de
várias offshores (empresas em paraísos fiscais com proprietários
sigilosos) operada pelo próprio João Bosco. Os peritos conseguiram, por
exemplo, identificar o retorno de US$ 2 milhões utilizados para comprar
um apartamento de luxo no Rio de Janeiro em nome da Rio Trading, uma
empresa instalada nas Ilhas Virgens Britânicas. Foram rastreados também
imóveis em nome da Antar, sediada no mesmo paraíso, em nome de Ronaldo
de Souza, que, segundo a PF, é sócio, procurador e testa-de-ferro de
Ricardo Sérgio. Pelas características dos depósitos, que eram
frequentes, suspeita-se que, por esse mesmo duto de lavagem, também
passaram contribuições de campanha. Além disso, Youssef tinha em sua
carteira principalmente dois tipos de clientes: narcotraficantes e
políticos. O laudo concluiu ainda que Ricardo Sérgio, enquanto ocupava o
cargo de diretor internacional do BB, ajudou a montar o esquema
bancário que operava com dinheiro de doleiros na fronteira, depois
transferido para a agência nova-iorquina do Banestado.
Os documentos anexados ao laudo provam o envolvimento do advogado e
procurador de Ricardo Sérgio, David Spencer, na abertura e movimentação
da conta 1461-9, em nome da empresa June International Corporation. Um
ofício do gerente do Banestado, Ercio Santos, encaminhado ao doleiro
Youssef em 20 de agosto de 1996, atribui a Spencer a responsabilidade
pela abertura da conta. “Segue cópia dos documentos referentes à abertura da June, em 8 de agosto
de 1996. Recebemos hoje do David Spencer”, diz a primeira linha da
correspondência na qual Ercio informa Youssef a respeito dos
procedimentos para movimentação da conta. Na carta, Youssef é tratado
intimamente por “Beto” e, ao se despedir, o gerente manda “um grande
abraço”. Ercio Santos sabia que mexia com dinheiro sujo. Informa, no
documento, que preferiu não enviar selo da June por malote para não
chamar a atenção.
O selo, uma espécie de carimbo metálico, traz a identificação da empresa no paraíso fiscal onde foi instalada. A perícia comprovou também que, além do dinheiro do tucanato, Spencer ajudou a lavar recursos desviados do Banco Noroeste e do Nacional. Casado com uma brasileira, o americano conheceu Ricardo Sérgio no Brasil quando o ex-diretor do BB ocupava um cargo de direção no Citibank. Por falar português fluentemente, tornou-se advogado de banqueiros brasileiros no Exterior.
O selo, uma espécie de carimbo metálico, traz a identificação da empresa no paraíso fiscal onde foi instalada. A perícia comprovou também que, além do dinheiro do tucanato, Spencer ajudou a lavar recursos desviados do Banco Noroeste e do Nacional. Casado com uma brasileira, o americano conheceu Ricardo Sérgio no Brasil quando o ex-diretor do BB ocupava um cargo de direção no Citibank. Por falar português fluentemente, tornou-se advogado de banqueiros brasileiros no Exterior.
Como procurador de Ricardo Sérgio, conforme o relatório, Spencer
abriu em 1989 a empresa Andover International Corporation nas Ilhas
Virgens Britânicas. Spencer – que era também tabelião em Nova York –
tinha respaldo legal para fechar as compras de imóveis no Brasil em nome
das empresas offshore de Ricardo Sérgio e sua turma, mantendo os nomes
dos verdadeiros donos em sigilo. Em uma dessas operações em 1989, por
exemplo, Spencer lavrou uma procuração em nome do engenheiro Roberto
Visneviski, outro sócio do tesoureiro tucano, para representar a empresa
Andover na compra de um conjunto de salas na avenida Paulista, avaliado
em R$ 1 milhão. Para especialistas em lavagem de dinheiro, a operação é
suspeita porque Visneviski assina duas vezes a transação: como vendedor
e como comprador. “Obviamente, a Andover é do próprio Ricardo Sérgio.
Foi uma operação clássica de internação de dinheiro”, avalia o jurista
Heleno Torres, um especialista na investigação de operações de lavagem.
Essa é apenas uma das 137 contas que já estão periciadas nos inquéritos.
Por elas trafegaram US$ 30 bilhões. A polícia calcula que mais de 90%
dessa montanha de dinheiro é ilegal, mais da metade resultado de
sonegação de impostos através de caixa 2.
Reação – As denúncias publicadas na última edição de ISTOÉ que
revelaram a sangria via Banestado caíram como uma bomba dentro do
governo. Já no sábado 1º, um assessor direto do ministro da Justiça,
Márcio Thomaz Bastos, procurou o diretor-geral da Polícia Federal, Paulo
Lacerda, pedindo informações sobre o laudo. Depois de conversar com o
delegado Antônio Carlos Carvalho de Souza, atual responsável pelo caso, e
com os peritos que trabalharam no escândalo, Lacerda comandou o
reagrupamento de todos os policiais que já participaram da operação. Na
quinta-feira 6, o chefe da PF reuniu a equipe e determinou a criação de
uma força-tarefa da PF em parceria com o Ministério Público e com a
Justiça. Além de Carvalho, o delegado José Francisco Castilho Neto e os
peritos Eurico Montenegro e Renato Rodrigues, que buscaram junto ao FBI e
organizaram toda a documentação existente hoje no Brasil, estão de
volta às investigações. Os três haviam sido colocados na geladeira
durante a administração tucana na PF. “É o maior caso de evasão de
divisas que eu conheço”, admitiu Lacerda na quinta-feira 6. “Vamos
investigar tudo e não cederemos a pressões de qualquer natureza”,
adverte o ministro Márcio Thomaz Bastos, antecipando-se a eventuais
novos nomes que o dossiê-bomba da PF venha a revelar.
O grupo, reforçado por dois escrivãos, voltará aos EUA nas próximas
semanas para buscar os documentos que trazem as movimentações bancárias
no biênio 1998-1999. Até agora, o trabalho dos peritos foi um exercício
de abnegação. “O número de peritos é pequeno para o volume de
informações que está sendo investigado”, diz o presidente da Associação
Nacional dos Peritos Criminais Federais, Roosevelt Júnior. A divulgação
do laudo também provocou uma corrida de procuradores que investigam
separadamente casos de lavagem em vários Estados. O procurador Guilherme
Schelb, que apura outros casos de lavagem, pediu o bloqueio das três
contas suíças do contrabandista e traficante foragido João Arcanjo
Ribeiro. O procurador Luís Francisco de Souza, que rastreia os passos de
Ricardo Sérgio, também quer ter acesso aos laudos produzidos pela PF. O
cearense José Gerin não perdeu tempo. Desembarcou em Foz do Iguaçu esta
semana para buscar detalhes sobre a quadrilha de doleiros que opera na
região Nordeste, entre eles Wilson Roberto Landim, preso há duas
semanas, que, pelos documentos, remeteu para o Exterior quase US$ 1
milhão em apenas seis meses.
OS BONS COMPANHEIROS
Principal articulador da formação dos consórcios que disputaram o
leilão das empresas de telecomunicações, o ex-diretor da área
internacional do Banco do Brasil, Ricardo Sérgio de Oliveira, saiu das
sombras do tucanato ao ser captado num grampo do BNDES em que dizia ao
ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros que iria conceder uma carta
de fiança ao consórcio coordenado pelo Banco Opportunity. “Estamos
agindo no limite da irresponsabilidade”, disse Ricardo Sérgio no grampo.
Depois da revelação, Ricardo Sérgio passou a sofrer uma série de
investigações no MP e na PF. Acusado de receber propina de empresas que
participaram da privatização, Ricardo Sérgio está sendo investigado
também por enriquecimento ilícito.
Ao assumir o cargo em 1994, convidou para chefe de gabinete o seu
fiel escudeiro João Bosco Madeiro da Costa. Por indicação do ex-diretor
do BB, Madeiro foi posteriormente para o cargo de diretor de
investimentos da Previ, o milionário fundo de pensão do BB que participa
do controle acionário da maior parte das teles privatizadas. Relatórios
da Secretaria de Previdência Complementar, do Ministério da
Previdência, revelaram que Madeiro centralizava todo o poder de
negociação do fundo com grandes empresas. Segundo o Ministério Público,
Madeiro também é suspeito de enriquecimento ilícito.
Blog do Luis Nassif
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