dom, 22/12/2013 - 13:56
- Atualizado em 22/12/2013 - 13:58
O repórter Fernando Tavaglini, do Estadão, trouxe a melhor
reportagem da semana para avaliar o comportamento dos mercados em
relação à economia: entrevistou um administrador de fundos campeão, Luís
Stuhlberger, que ganhou no começo do ano apostando no pessimismo; e
agora aposta no otimismo, mesmo com ressalvas.
Os melhores termômetros do mercado são os grandes gestores de
fundos e os tesoureiros dos grande grupos. Quando erra, o economista
perde credibilidade (no caso brasileiro, nem isso). O gestor perde
dinheiro.
Por isso mesmo são os leitores mais privilegiados das notícias
econômicas. Sabem separar a espuma do essencial, o conteúdo das
manchetes escandalosas.
As análises dos economistas são apenas um dos elementos de decisão.
Elas servem de ponto de partida porque partem de uma metodologia de
pegar o passado e projetar o futuro. Ou seja, se nada for feito nesse
período, o resultado lá na frente será xis.
Ora, a construção do futuro depende de outros fatores subjetivos,
nos quais experiência e intuição são os elementos que diferenciam os
grandes gestores da massa dos analistas.
Como um craque como Stuhlberger analisa, por exemplo, a questão fiscal:
1. Lê as notícias sobre manipulação de indicadores e se assusta. E com razão.
2, Depois, lê as análises dos economistas prevendo que, a continuar
no ritmo atual, o Brasil perderá a condição de grau de investimento em
pouco tempo. São mencionadas agências de risco, frases entre aspas de
gestores etc.
Aí, fará seu próprio contraponto:
1. Dará o devido desconto ao cenário econômico, porque, na maioria
das vezes, limita-se a ler o passado e projetar o futuro. Como já dito,
entre o passado e o futuro, há as decisões a serem tomadas.
2, Em vez de se valer dos jornais, vai buscar a notícia na fonte.
Recebe os relatórios da Standard & Poors e constata que as manchetes
de jornal são terrorismo: não há o menor risco de derrubar a
classificação nos próximos anos.
3. Aí ele volta os olhares para Brasilia, lê as declarações de
Guido, as manifestações de Dilma, dá o devido desconto nos tropeções
retóricos e se fixa no essencial: caiu a ficha de que não se deve
brincar com inflação e questão fiscal.
A partir daí, define sua estratégia.
Nem se pense que o grande gestor desgosta das manchetes
escandalosas ou inverossímeis: elas se constituem em elemento essencial
de lucro. Quanto maior a dessintonia entre a boa e a má informação,
maior o ganho do gestor competente. Em suma, quanto mais agentes de
mercado acreditarem na direção apontada pelas manchetes, maior o ganho
de quem fizer o contraponto
As conclusões de Stuhlberger
Na entrevista de Stuhlberger as conclusões essenciais são as seguintes:
As críticas dos analistas e a opinião do mercado são um fator de
contenção. Ou seja, se a situação fiscal começa a degradar, há uma grita
que acorda o governo para a questão, seguindo-se medidas corretivas.
Esse fator de racionalidade é essencial para garantir as expectativas
positivas.
A política econômica importa-se muito mais com a inflação do que
com a Selic. Ou seja, o fantasma da inflação é garantia de aumento dos
juros e dos ganhos de tesouraria. O fato do BC ter jogado a toalha da
Selic baixa é péssimo para a economia; mas trouxe tranquilidade para o
mercado.
Fica tranquilo em saber que o governo já tem o diagnóstico de que a
próxima etapa do desenvolvimento se dará através de investimentos -
particularmente em infraestrutura. É sinalização importante para a
reciclagem da poupança.
Sabe que a questão fiscal imediata se resolve com alguma melhoria na margem.
Não consegue entender porque o Banco Central persiste em segurar a desvalorização cambial - que considera irreversível.
Persistema fatores de risco, especialmente nas contas externas, mas
acredita na racionalidade de Dilma Rousseff e sabe que muitos dos
problemas apontados pela imprensa só se resolvem com muito tempo do país
como um todo.
Do Estadão
Para gestor de recursos, modelo de desenvolvimento do País é
ruim, mas ele diz estar se posicionando para a tendência de um 'swing'
de discreta melhora
21 de dezembro de 2013 | 23h 06
Fernando Travaglini - O Estado de S.Paulo
Luis Stuhlberger, que administra uma das famílias de fundos de
investimentos mais bem-sucedidas do País, prefere não dizer se está
otimista ou pessimista. "Gestor de patrimônio não tem de ter essa
resposta", diz ele. "Tem de pensar no que está nos preços." Mas ao final
admite: "Já estive expressando nos meus fundos uma visão mais negativa
do que hoje. Isso não quer dizer que estou otimista. Acho apenas que a
gente vai ganhar um tempo", afirma. "O Brasil ainda melhora um pouco
antes de piorar."
'O governo aprendeu que a inflação tira a popularidade com uma rapidez enorme. Muito mais do que a Selic', diz Luís Stuhlberger
NOTÍCIAS RELACIONADAS'Economista gosta muito de pajelança', diz
Belluzzo‘EsseEle explica: "Nosso modelo de desenvolvimento é ruim, mas a
gente tende a ter um ‘swing’ (oscilação) de discreta melhora. Estou me
posicionando para isso", afirma em entrevista ao Broadcast, serviço de
notícias em tempo real da Agência Estado, na sede da corretora Credit
Suisse Hedging-Griffo, da qual é diretor.
Esse reposicionamento, que significa ajustar ativos superiores a R$
20 bilhões, vem depois de um ano em que o fundo Verde, sob sua gestão,
apostou em acentuada piora das condições brasileiras.
O resultado - que ele faz questão de dizer que o deixou feliz por
ter feito as previsões corretas, que é o seu principal papel como
gestor, mas "triste com o País" - foi uma valorização acumulada de
16,14% no ano até novembro, contra um CDI (juros) de 7,22% e uma bolsa
que perdeu quase 15% nesse período.
Dois aspectos o haviam levado, ainda em setembro de 2012, a prever
essa deterioração: a política fiscal e as contas externas. Mais
recentemente, no entanto, ele começou a ver sinais mais positivos vindos
tanto de Brasília quanto do cenário externo. O governo Dilma Rousseff,
diz ele, tomou algumas medidas na direção certa, como o leilão de Libra,
as concessões de infraestrutura à iniciativa privada, além do combate à
inflação - inflação que ele credita como um dos principais
catalisadores para as manifestações de junho.
O reflexo da mudança na visão de Stuhlberger nas carteiras de
investimentos dos fundos administrados por ele se deu principalmente
pela compra de ações brasileiras - cuja participação havia caída para
8%, mas voltou recentemente para 13%. Os fundos mantiveram, no entanto, a
posição comprada em dólar (apostando na alta da moeda americana) - que
ele entende estar "represado" pela atuação do Banco Central, que vem
ofertando semanalmente US$ 2 bilhões em swaps cambiais.
Durante a conversa, na última quarta-feira, Stuhlberger interrompeu
uma das respostas, às 17h01, para se informar sobre a reunião do
Federal Reserve que terminara pouco antes e da qual saiu a decisão de
reduzir, a partir de janeiro, as compras mensais de ativos em US$ 10
bilhões (processo chamado no mercado de tapering). "Terminou o Fed?",
pergunta, ao telefone. "Saiu o taper! Humm... Em janeiro já? Uau.
Uh-huh... pouca coisa. E aqui? Os juros? Janeiro 17... Só? Ah. E o
dólar? Ah, não andou. Não mexeu nada, então. Índice? Nossa, quase que
sem... sem... Pouco impacto, hein? Tá bom. Ok", finaliza a ligação. A
seguir, os principais trechos da entrevista.
Menos pessimista
"Já estive expressando nos meus fundos uma visão mais negativa do
que hoje. Isso não quer dizer que estou otimista. Acho apenas que a
gente vai ganhar um tempo. O Brasil ainda melhora um pouco antes de
piorar. Nosso modelo de desenvolvimento é ruim, mas a gente tende a ter
um ‘swing’ (oscilação) de discreta melhora. Estou me posicionando para
isso. A piora na percepção do Brasil aumenta o prêmio, aumenta a
angústia, mas pelo menos já serviu para alguma coisa. Pelo menos, o
governo acordou para algumas questões. Estávamos assim há quatro, cinco
anos e de repente destravou Libra, destravou Galeão, destravou Confins,
estradas. O governo acordou para dar um certo ‘push’ nessa agenda. Você
não conserta o modelo totalmente, mas joga o muro onde você vai bater
para mais longe."
Inflação e manifestações
"Minha percepção é que o País continua com uma certa agonia lenta
nesse modelo de inflação resiliente, sem sair muito da meta, e pouco
crescimento por mais algum tempo. Mas o governo aprendeu que a inflação
tira a popularidade com uma rapidez enorme. Muito mais do que a Selic
(taxa básica de juros). Ninguém se incomoda com a Selic. A inflação,
principalmente de alimentos, corrói a renda. Esse movimento de junho
(manifestações) foi desencadeado mesmo pela alta de alimentos de abril e
maio. E acho que em saúde, educação e mobilidade urbana se ganhou muito
pouco. Essa noção do equívoco ela também veio muito rápido."
Moto-contínuo tropical não deu certo
"Só gerar consumo não deu certo. Esse movimento todo voltado
somente em transferência de renda, aumento do salário mínimo e crédito,
investindo 5% menos do PIB do que o mínimo necessário, uma hora pagaria o
seu preço. O governo tem de planejar o desenvolvimento. Tem de planejar
os vetores do desenvolvimento e, na verdade, o governo ficou feliz com a
inclusão social e a distribuição de renda e achou que o resto viria
naturalmente, a reboque. É o ‘moto-contínuo tropical’, movido por
princípios como a ‘oferta cria sua própria demanda’, ‘a previdência é um
ativo, não um passivo’ e ‘quanto mais se aumenta o salário mínimo
melhor, porque a renda se espalha e todos ganham’. É como se dissessem:
‘deixe as commodities fazerem o trabalho delas e a gente vai crescendo’.
Agora a gente viu que isso não existe. Quando eu vejo que o governo já
tem o diagnóstico, eu fico feliz. Eu não negligencio esse fator. Não
acho que isso seja pouca coisa."
PT e Dilma estão aprendendo
"Eu acho, honestamente, que o PT sempre aprende. Acho a Dilma uma
mulher inteligente e preparada. Se você me dissesse que conseguiriam
ressuscitar a Margaret Thatcher, ainda assim ela teria dificuldades para
consertar isso aqui. Por que onde você vai achar os R$ 4 trilhões que
deixaram de ser investidos nos últimos 20 anos? Isso aqui não é um
problema de pessoas. O aparente ‘way of life’ dos mercados emergentes,
enfiando US$ 1 trilhão por ano, melhora muito. Mas quanto tempo é
necessário para melhorar a qualidade das instituições? Demora muito, uma
centena de anos. Estamos vivendo as dores de ter melhorado algumas
coisas e não melhorado em outras."
Câmbio represado pelos US$ 80 bi em swaps
"O BC tem de agir. Não estou dizendo que o Banco Central está
equivocado (com o programa de oferta diária de swap cambial - venda de
dólares). Eu acho que ele está, talvez, exagerando na dose. Vendendo
seguro em dia de sol. Em momentos de pânico, como quando começou a
história, em maio, do tapering, todas as moedas se depreciaram. Hoje o
Brasil ficou sozinho nessa política de intervenção. Isso não é de se
achar que é normal. Há dois fatores para levar a uma desvalorização no
câmbio: conta corrente (contas externas) ou fiscal. E os dois vão na
mesma direção (de piora). Acho que o BC vai administrar uma alta. Não
vai querer congelar o câmbio."
Fiscal precisa de Pelés para marcar gol todo ano
"As despesas do governo - e não é um ano eleitoral - vão acabar o
ano subindo quase 8%. E as receitas, algo como 3,5%, mesmo com Libra e
Refis. A receita federal sem as excepcionalidades estaria crescendo na
proporção do PIB, 2,5%. O superávit primário sem as receitas
extraordinárias é quase zero. Está em 0,3%, 0,4% (no conceito estrutural
- sem receitas extraordinárias). Mostrar que o País tem
sustentabilidade fiscal sem precisar de receitas extraordinárias é
justamente o maior desafio brasileiro. Isso me lembra dos anos 60,
quando falavam que o Santos só ganhava porque tinha o Pelé. O Pelé
estava sempre lá para fazer os gols salvadores. Este ano, o Brasil teve
seus ‘Pelés’. Teve Libra, o Refis da crise e dos lucros no exterior.
Quais serão os Pelés dos próximos anos?"
Dá para ter alguma melhora na margem
"Em suma, eu, por incrível que pareça, estou menos pessimista do
que já estive. Um país que gasta tanto dinheiro, que consome 41% do PIB,
se ele puser um pouco de ordem na casa, ainda que no longo prazo esse
modelo seja insustentável sem reformas, dá para melhorar. Alguma
melhoria na margem dá para ter e acho que o mundo indo bem nos ajuda."
Exagero com o tapering
"Saiu o tapering. Se você me perguntasse às 16h50 (dez minutos
antes do anúncio), eu diria que iriam esperar mais um mês. Mas é questão
de mais um mês, apenas. Não tem muita diferença. Agora, dado que havia
uma expectativa de 70% de não ocorrer agora o tapering, eu esperava que a
reação dos mercados, que a valorização do dólar, fosse maior do que
foi. O tapering, francamente, não é tightening (aperto). É simplesmente
imprimir menos dinheiro. Não é que estão subindo os juros. Há um certo
exagero nisso. Deu um certo ‘shake’ em maio, junho, mas no segundo
semestre ele foi típico: cada um na sua. Honestamente, não culpe os
americanos, os gregos, os espanhóis, os russos e os chineses pelos
problemas dos brasileiros. Nossos problemas são nossos. De todos nós. É
muito fácil sempre colocar a culpa no Fed pelos nossos problemas.
Vamos ignorar o Fed."
Vamos ignorar o Fed."
Economia internacional não joga contra
"A China andou bem. A Europa andou médio, mas melhorando. E os
Estados Unidos andaram muito. Isso naturalmente é benéfico. Pelo menos
para a indústria brasileira e para as commodities. Não necessariamente é
bom para o consumo, mas ajuda a economia brasileira. Em 2014, o cenário
se repetirá, com crescimento moderado no mundo e com juros sob controle
lá fora."
Blog do Luis Nassif
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