A GENTE NUNCA PERDE POR SER LEGÍTIMO, MAS QUEM CONTA A HISTÓRIA SÃO OS VENCEDORES, NÃO ESQUEÇAM!
por Hildegard Angel, em seu blog, sugerido por Messias Franca de Macedo
O fascismo se expande hoje nas mídias sociais, forte e feioso como um
espinheiro contorcido, que vai se estendendo, engrossando o tronco,
ampliando os ramos, envolvendo incautos, os jovens principalmente, e
sufocando os argumentos que surgem, com seu modo truculento de ser.
Para isso, utiliza-se de falsas informações, distorções de fatos,
episódios, números e estatísticas, da História recente e da remota, sem o
menor pudor ou comprometimento com a verdade, a não ser com seu
compromisso de dar conta de um Projeto.
Sim, um Projeto moldado na mesma forma que produziu 1964, que, os
minimamente informados sabem, foi fruto de um bem urdido plano, levando
uma fatia da população brasileira, a crédula classe média, a um processo
de coletiva histeria, de programado pânico, no receio de que o país
fosse invadido por malvados de um fictício Exército Vermelho, que lhes
tomaria os bens e as casas, mataria suas criancinhas, lhes tiraria a
liberdade de ir, vir e até a de escolher.
Assim, a chamada elite, que na época formava opinião sobre a classe
média mais baixa e mantinha um “cabresto de opinião” sobre seus
assalariados, foi às ruas com as marchas católicas engrossadas pelos
seus serviçais ao lado das bem intencionadas madames.
Elas mais tarde muito se arrependeram, ao constatar o quanto
contribuíram para mergulhar o país nos horrores de maldades medievais.
Agora, os mesmos coroados, arquitetos de tudo aquilo, voltam a agir
da mesma forma e reescrevem aquele conto de horror, fazendo do mocinho
bandido e do bandido mocinho, de seu jeito, pois a História, meus
amores, é contada pelos vencedores. E eles venceram. Eles sempre vencem.
Sim, leitores, compreendo quando me chamam de “esquerdista
retardatária” ou coisa parecida. Esse meu impulso, certamente tardio, eu
até diria sabiamente tardio, preservou-me a vida para hoje falar,
quando tantos agora se calam; para agir e atuar pela campanha de Dilma,
nos primórdios do primeiro turno, quando todos se escondiam, desviavam
os olhos, eram reticentes, não declaravam votos, não atendiam aos
telefonemas, não aceitavam convites.
Essa minha coragem, como alguns denominam, de apoiar José Dirceu, que
de fato sequer meu amigo era, e de me aprofundar nos meandros da AP
470, a ponto de concluir que não se trata de “mensalão”, conforme a
mídia a rotula, mas de “mentirão – royalties para mim, em pronunciamento
na ABI – eu, a tímida, medrosa, reticente “Hildezinha”, ousando
pronunciamentos na ABI! O que terá dado nela? O que terá se operado em
mim?
Esse extemporâneo destemor teve uma irrefreável motivação: o medo
maior do que o meu medo. Medo da Sombra de 64. Pânico superior àquele
que me congelou durante uma década ou mais, que paralisou meu
pensamento, bloqueou minha percepção, a inteligência até, cegou qualquer
possibilidade de reação, em nome talvez de não deixar sequer uma
fresta, passagem mínima de oxigênio que fosse à minha consciência, pois
me custaria tal dor na alma, tal desespero, tamanha infelicidade, noção
de impotência absoluta e desesperança, perceber a face verdadeira da
Humanidade, o rosto real daqueles que aprendi a amar, a confiar…
Não, eu não suportaria respirar o mesmo ar, este ar não poderia
invadir os meus pulmões, bombear o meu coração, chegar ao meu cérebro.
Eu sucumbiria à dor de constatar que não era nada daquilo que sempre me
foi dito pelos meus, minha família, que desde sempre me foi ensinado. O
princípio e mandamento de que a gente pode neutralizar o mal com o bem.
Eu acreditava tão intensamente e ingenuamente no encanto da bondade, que
seguia como se flutuasse sobre a nojeira, sem percebê-la, sem pisar
nela, como se pisasse em flores.
E aí, passadas as tragédias, vividas e sentidas todas elas em nossas
carnes, histórias e mentes, porém não esquecidas, viradas as páginas,
amenizado o tempo, quando testemunhei o início daquela operação
midiática monumental, desproporcional, como se tanques de guerra, uma
infantaria inteira, bateria de canhões, frotas aérea e marítima
combatessem um único mortal, José Dirceu, tentando destrui-lo, eu
percebi esgueirar-se sobre a nossa tão suada democracia a Sombra de 64!
Era o início do Projeto tramado para desqualificar a luta heroica
daqueles jovens martirizados, trucidados e mortos por Eles, o
establishment sem nomes e sem rostos, que lastreou a Ditadura, cuja
conta os militares pagaram sozinhos. Mas eles não estiveram sozinhos.
Isso não podia ser, não fazia sentido assistir a esse massacre
impassível. Decidi apoiar José Dirceu. Fiz um jantar de apoio a ele em
casa, Chamei pessoas importantes, algumas que pouco conhecia. Cientistas
políticos, jornalistas de Brasília, homens da esquerda, do centro,
petistas, companheiros de Stuart do MR8, religiosos, artistas engajados.
Muitos vieram, muitos declinaram. Foi uma reunião importante. A
primeira em torno dele, uma das raras. Porém não a única. E disso muito
me orgulho.
Um colunista amigo, muito importante, estupefato talvez com minha
“audácia” (ou, quem sabe, penalizado), teve o cuidado de me telefonar na
véspera, perguntando-me gentilmente se eu não me incomodava de ele
publicar no jornal que eu faria o jantar. “Ao contrário – eu disse –
faço questão”.
Ele sabia que, a partir daquele momento, eu estaria atravessando o meu Rubicão. Teria um preço a pagar por isso.
Lembrei-me de uma frase de minha mãe: “A gente nunca perde por ser
legítima”. Ela se referia à moda que praticava. Adaptei-a à minha vida.
No início da campanha eleitoral Serra x Dilma, ao ler aqueles
sórdidos emails baixaria que invadiam minha caixa, percebi com maior
intensidade a Sombra de 64 se adensando sobre nosso país.
Rapidamente a Sombra ganhou corpo, se alastrou e, com eficiência,
ampliou-se nestes anos, alcançando seu auge neste 2013, instaurando no
país o clima inquisitorial daquela época passada, com jovens e velhos
fundamentalistas assombrando o Facebook e o Twitter. Revivals da TFP,
inspirando Ku Klux Klan, macartismo e todas as variações de fanatismo de
direita.
É o Projeto do Mal de 64, de novo, ganhando corpo. O mesmo espinheiro
das florestas de rainhas más, que enclausuram príncipes, princesas,
duendes, robin hoods, elfos e anõezinhos.
Para alguns, imagens toscas de contos de fadas. Para mim, que vi meu
pai americano sustentar orfanato de crianças brasileiras produzindo
anõezinhos de Branca de Neve de jardim, e depois uma Bruxa Má, a
Ditadura, vir e levar para sempre o nosso príncipe encantado,
torturando-o em espinheiros e jamais devolvendo seu corpo esfolado,
abandonado em paradeiro não sabido, trata-se de um conto trágico,
eternamente real.
Como disse minha mãe, e escreveu a lápis em carta que entregou a
Chico Buarque às vésperas de ser assassinada: “Estejam certos de que não
estou vendo fantasmas”.
Feliz Ano Novo.
Inclusive para aqueles injustamente enclausurados e cujas penas não estão sendo cumpridas de acordo com as sentenças.
É o que desejo do fundo de meu coração.
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Viomundo
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