Por Janio de Freitas
Quatorze decapitados, entre 59 assassinados de janeiro às vésperas do
Natal. Primeiro, o que explica tamanha ferocidade? Além disso, o que fez
com que tais crimes e números pudessem se acumular, com o decorrer do
ano, sem alarmar o meio político, social e cultural que os circundaram,
ainda hoje não alarmados? Por fim, a localização e a situação onde
tamanhas monstruosidades podem ocorrer serão mesmo um país, um regime
constitucional democrático, um Estado de Direito?
O horror é ainda mais extenso, sem parecer que pudesse sê-lo. Mulheres e
irmãs em visita a presos são obrigadas a deixar-se estuprar, para que
seus parentes não sejam assassinados naquele "complexo prisional" de
Pedrinhas, São Luís, Maranhão.
A bestialidade como forma de vida em Pedrinhas não se torna conhecida,
afinal, porque o sistema administrativo que a mantém –governo e varas de
execuções penais– decidisse combatê-la. Foi, sim, por força do
inesperado. Uma rebelião causou mais quatro mortes, com três
decapitações, e representantes do Conselho Nacional de Justiça e do
Ministério Público foram verificar o que houvera. Contra a submissão
imposta nas cadeias, e a todo risco, detentos tiveram a hombridade de
defender suas mulheres e denunciar as violências sexuais.
Pensava-se ter noção da desumanidade que o nosso pretenso Estado
Democrático de Direito e seus Direitos Humanos mantêm nos cárceres do
Brasil todo. A decapitação como método e a violação de familiares levam a
perguntar menos sobre o sistema carcerário do que sobre quem está fora e
acima dele. Nos governos, no Ministério Público e, sobretudo, no
Judiciário.
CAUSA PRÓPRIA
Enquanto os honrados do PSDB bloqueiam as investigações de seus feitos
contra os cofres públicos de São Paulo, o líder de sua bancada na
Câmara, deputado Carlos Sampaio, se ocupa com incriminações também do
governo ou do PT. Sua ideia mais recente é uma ação contra Dilma
Rousseff, na Justiça Eleitoral, por mandar cartões de Boas Festas aos
funcionários. Sampaio, promotor de origem, considera que os cartões são
abuso de poder, com finalidade eleitoral.
Então Dilma faz campanha desde o primeiro ano de governo. E Carlos
Sampaio, para ser coerente, terá de processar muitos ministros,
governadores e secretários de governo, inclusive do PSDB. Mas tem
alternativa a esse trabalhão: é ser um pouco mais sério e menos
ridículo, já que está pensando na sua própria reeleição.
VIAS DE ROUBO
Os estragos feitos pelas enchentes nas estradas expõem, e as fotos e
vídeos mostram, um elemento comum tão importante quanto desprezado: o
asfaltamento finíssimo das pistas, diretamente sobre terra instável,
contra a necessária técnica de camadas preliminares de sustentação. Daí a
curta duração dos asfaltamentos e a péssima qualidade das estradas, com
a buraqueira causadora de tantos danos e desastres.
Mas, para as empreiteiras, um modo de aumentar ainda mais os lucros, com
a realização apenas parcial do serviço necessário e a repetição dele em
futuro muito mais próximo.
Estradas são vias de roubo em muitos sentidos.
Estradas são vias de roubo em muitos sentidos.
Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha,
é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com
perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na
versão impressa do caderno "Poder" aos domingos, terças e
quintas-feiras.
Folha de S.Paulo
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