Da Folha
LINDBERGH FARIAS
A Selic continua caindo. Agora o governo tem de aproveitar tal folga
nos gastos financeiros para aumentar investimentos e também cortar carga
tributária
Uma revolução está acontecendo no Brasil. É a redução para patamares
civilizados da taxa de juros básica da economia, a taxa Selic. Em 1999, a
Selic alcançou o pico de 45% ao ano. No início do governo Lula, em
2003, era 26,5%. Na última semana, chegou em 7,25%, após novo corte. Ela
pode ser reduzida ainda mais: a taxa de juros básica real nos países
desenvolvidos está negativa.
Há no país, porém, uma anomalia. Aliás, só encontrada aqui. Parte dos
títulos da dívida pública remunera seus detentores de acordo com a taxa
de juros Selic. Logo, quando a Selic cai, as despesas governamentais
são reduzidas.
O contrário também ocorre: quando a taxa Selic sobe, as despesas
públicas aumentam, praticamente desperdiçando recursos. Esses gastos não
criam emprego, renda ou bem-estar social.
Tais recursos só não são totalmente desperdiçados porque cumprem a
função de remunerar os credores do governo. Mas credores podem ser
remunerados com juros mais baixos e com menos recursos públicos. O
governo tem pago volumes elevados de recursos aos detentores de títulos.
Em 2010, pagou R$ 195,4 bilhões e, em 2011, R$ 236,6 bilhões. Até julho
deste ano, pagou R$ 128,5 bilhões.
Com a revolução da redução da Selic, muitos recursos estão sendo
economizados. Novas quedas trarão mais economia para o governo federal.
Em 2012, o Departamento Econômico do Banco Central espera que haja uma
economia de R$ 30 bilhões graças à redução da Selic. Em 2013, a folga
orçamentária será maior.
Há várias formas de o governo utilizar esses R$ 30 bilhões. Pode
reduzir a carga tributária. Pode, ainda, aumentar os investimentos em
infraestrutura. E pode aumentar os gastos com educação, segurança
pública ou saúde, por exemplo.
A economia dos países avançados está semiestagnada. Paira no ar a
possibilidade de desaceleração de países em desenvolvimento. É hora de o
governo fazer a economia brasileira subir a ladeira acelerando, em
marcha de força. Para tanto, deveria aumentar os seus investimentos e
reduzir a carga tributária, principalmente sobre o ato empresarial de
investir.
Se não for gasta, a economia esperada de R$ 30 bilhões se
transformará em redução do déficit público, que é a diferença entre as
receitas e as despesas de juros somadas às despesas primárias (gastos de
custeio e investimento).
Para que os R$ 30 bilhões sejam transformados em investimentos, o
governo precisará realizar uma importante operação contábil: reduzir o
superávit primário, que é a diferença entre as receitas e as despesas
primárias. Haveria redução do superávit porque ocorreria o aumento de
despesas primárias (devido ao aumento do investimento público).
Tal redução do superávit não provocaria um aumento do déficit público
previsto para 2012. O déficit seria mantido, já que as despesas totais
teriam a mesma magnitude -o que haveria seria uma mera mudança de
composição dos gastos: despesas de juros seriam transformadas em
despesas primárias (o novo investimento público).
Mais ainda, a economia com o pagamento dos juros é alta e crescente.
Parte dela poderia também ser transformada em redução de carga
tributária, ou seja, haveria redução da receita do governo. Apesar da
queda da arrecadação, o déficit público previsto para o final do ano
seria mantido: a desoneração tributária seria sincronizada com a queda
das despesas de juros e o aumento do investimento público.
A questão crucial é que a redução de despesas de pagamento de juros
seria transformada em aumento do investimento e redução da carga
tributária. Portanto, a implicação dessa recomposição seria neutra sobre
a contabilidade orçamentária. Todavia, as mudanças reais que ocorreriam
teriam alto impacto: haveria melhoria da infraestrutura, redução de
custos de produção e aumento da competitividade das empresas. Portanto, o
governo tem munição para não deixar a economia desacelerar.
LINDBERGH FARIAS, 42, é senador pelo PT-RJ
Blog do Luis Nassif
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