Postado em 25 Mar 2014
O
artigo abaixo é de autoria do escritor e jornalista Edmundo Moniz (1911
– 1997). Foi publicado no Correio da Manhã em agosto de 1964. O Correio
era, então, um dos principais jornais do Brasil; e Moniz, um de seus
mais destacados colunistas.
A farsa de apresentar, como revolução, a quartelada de abril já se acha completamente desfeita e desmoralizada.
Não era preciso um movimento revolucionário, se fosse o caso, para combater a subversão e a corrupção. Além do mais, tanto o conceito de corrupção como o conceito de subversão não ficaram devidamente esclarecidos pelos governantes atuais.
Corruptos conhecidos, de escala internacional, orgulhosos de serem o que são, exerceram e exercem uma poderosa influência na constituição e na vida do governo.
E o que dizer dos subversivos? Tudo aquilo de que eles eram acusados de pretender executar foi posto em prática, sem a menor cerimônia, pela nova situação. Tivemos a Constituição violada, o Congresso coagido, o Poder Judiciário ameaçado, sem falar nos atentatos aos direitos políticos e à legalidade democrática e, finalmente, o adiamento das eleições de 65 com a prorrogação do mandato presidencial.
A revolução é por si mesma subversiva, como é subversivo o golpe de Estado. A diferença entre uma coisa e outra é que o golpe de Estado se limita à mudança política do governo por meio da força armada. A revolução, quer seja levada à frente pela violência ou pelo compromisso de classes, transforma a estrutura econômica e social de uma nação.
A revolução nos países subdesenvolvidos, coloniais e semicoloniais, tem um caráter específico, que é o da emancipação econômica.
O Brasil vinha operando a revolução burguesa de maneira democrática e pacífica, pelo aceleramento do desenvolvimento industrial, pela perspectiva da reforma agrária, pela possibilidade de tornar-se economicamente independente, libertando-se da tutela imperialista.
Essa revolução constituía uma experiência nova pelo aspecto que tomou em contraste com as diversas tentativas de emancipação nacional por meio de convulsões internas.
Chegou a ser uma convicção profundamente arraigada em todos os setores de que não haveria mais clima, no Brasil, país pré-desenvolvido, para um golpe militar que criasseum estado de exceção, com a violação da ordem constitucional e democrática.
Recordava-se para o fortalecimento dessa tese, que a independência política, a Abolição e a República se fizeram sem derramamento de sangue e que o mesmo aconteceria com o complemento da revolução nacional por meio das reformas, que eram exigidas organicamente pelas próprias necessidades do desenvolvimento das forças produtivas.
Mas que vemos? A interrupção do processo democrático, com o estabelecimento de uma ditadura disfarçada. E quais as consequências dessa ditadura? O país estagnado e sem saída imediata. As medidas tomadas, até agora, no campo econômico e financeiro, cerraram as portas até mesmo para as soluções de emergência.
Onde estão os elementos da corrupção e da subversão? Os que eram acusados por uma ou outra coisa e responsáveis pela anarquia administrativa encontram-se fora do poder. Mas a situação nacional piora de momento para momento, de dia para dia, de mês para mês.
O preço dos bens de consumo essenciais ao povo sobe de maneira vertiginosa. Não é possível o congelamento de salário, como se tem feito, porque não é possível deter a carestia que se tornou incontrolável. Para combate a crise econômica, que tende a se agravar, o governo fala em aumentar os impostos, restringir o crédito e reduzir as despesas orçamentárias.
Mas a inflação continua de maneira avassaladora, a produção diminui e surge o desemprego.
O governo só agiu com rapidez e eficiência na modificação da lei de remessa de lucros, que vinha não em interesse da economia nacional e sim em benefício do capital estrangeiro.
Deu o Brasil algum passo à frente, depois do movimento de abril, para a sua libertação nacional?
Aí estão os fatos para comprovar a realidade econômica e política. Só se verifica o recuo, o retrocesso. Nenhuma medida foi tomada seriamente para a efetivação das reformas e melhoria do país e do povo.
A chamada revolução não fez outra coisa senão deter a revolução brasileira.
Evidentemente, nada se poderá fazer numa nação atemorizada. A democracia não é apenas uma conquista moral que garante os direitos do homem, necessários à própria dignidade de viver. A democracia é também uma conquista histórica da natureza objetiva no campo político e social.
Não é possível realizar nenhuma reforma, no Brasil, o livre debate, sem a plena liberdade de pensamento. Nada se fará de positivo, desde que haja constrangimento, coação e temor.
E por que o Ato Institucional? Por que a supressão das liberdades públicas? Por que a cassação dos direitos políticos? Por que a suspensão das garantias constitucionais?
O que se verifica, atualmente, é uma liberdade consentida, mas não a plena liberdade assegurada pela Constituição de 1946.
Não resta dúvida: se as reformas forem levadas ao Congresso e aprovadas, neste ambiente de terror, correrão o risco de não passar de letra morta. O essencial não é a votação de uma lei e sim a transformação da estrutura social para dar ao país a sua emancipação econômica.
O processo de desenvolvimento econômico como o da democratização política foram interrompidas no País com o movimento de abril. Mas não se muda a mentalidade de um povo com medidas administrativas ou a instauração do terror policial e militar. Não se altera uma realidade histórica por meio da força que episodicamente se faz sentir e se impõe.
A história foi sempre assim: dois passados para a frente e um passo para trás. De outra forma, a humanidade não teria chegado ao que chegou presentemente.
O eclipse da democracia brasileira não quer dizer o seu crepúsculo. A redemocratização do país se imporá como a necessidade primordial, inerente à sua própria sobrevivência.
O povo sabe o que representa a liberdade. E nunca a liberdade é tão querida e tão desejada como na hora em que se encontra em perigo.
A vida política do país está em ameaçada pelos civis e militares da direita, que continuam a conspirar para impedir que o Brasil possa reencontrar o caminho de sua verdadeira revolução.
A farsa de apresentar, como revolução, a quartelada de abril já se acha completamente desfeita e desmoralizada.
Não era preciso um movimento revolucionário, se fosse o caso, para combater a subversão e a corrupção. Além do mais, tanto o conceito de corrupção como o conceito de subversão não ficaram devidamente esclarecidos pelos governantes atuais.
Corruptos conhecidos, de escala internacional, orgulhosos de serem o que são, exerceram e exercem uma poderosa influência na constituição e na vida do governo.
E o que dizer dos subversivos? Tudo aquilo de que eles eram acusados de pretender executar foi posto em prática, sem a menor cerimônia, pela nova situação. Tivemos a Constituição violada, o Congresso coagido, o Poder Judiciário ameaçado, sem falar nos atentatos aos direitos políticos e à legalidade democrática e, finalmente, o adiamento das eleições de 65 com a prorrogação do mandato presidencial.
A revolução é por si mesma subversiva, como é subversivo o golpe de Estado. A diferença entre uma coisa e outra é que o golpe de Estado se limita à mudança política do governo por meio da força armada. A revolução, quer seja levada à frente pela violência ou pelo compromisso de classes, transforma a estrutura econômica e social de uma nação.
A revolução nos países subdesenvolvidos, coloniais e semicoloniais, tem um caráter específico, que é o da emancipação econômica.
O Brasil vinha operando a revolução burguesa de maneira democrática e pacífica, pelo aceleramento do desenvolvimento industrial, pela perspectiva da reforma agrária, pela possibilidade de tornar-se economicamente independente, libertando-se da tutela imperialista.
Essa revolução constituía uma experiência nova pelo aspecto que tomou em contraste com as diversas tentativas de emancipação nacional por meio de convulsões internas.
Chegou a ser uma convicção profundamente arraigada em todos os setores de que não haveria mais clima, no Brasil, país pré-desenvolvido, para um golpe militar que criasseum estado de exceção, com a violação da ordem constitucional e democrática.
Recordava-se para o fortalecimento dessa tese, que a independência política, a Abolição e a República se fizeram sem derramamento de sangue e que o mesmo aconteceria com o complemento da revolução nacional por meio das reformas, que eram exigidas organicamente pelas próprias necessidades do desenvolvimento das forças produtivas.
Mas que vemos? A interrupção do processo democrático, com o estabelecimento de uma ditadura disfarçada. E quais as consequências dessa ditadura? O país estagnado e sem saída imediata. As medidas tomadas, até agora, no campo econômico e financeiro, cerraram as portas até mesmo para as soluções de emergência.
Onde estão os elementos da corrupção e da subversão? Os que eram acusados por uma ou outra coisa e responsáveis pela anarquia administrativa encontram-se fora do poder. Mas a situação nacional piora de momento para momento, de dia para dia, de mês para mês.
O preço dos bens de consumo essenciais ao povo sobe de maneira vertiginosa. Não é possível o congelamento de salário, como se tem feito, porque não é possível deter a carestia que se tornou incontrolável. Para combate a crise econômica, que tende a se agravar, o governo fala em aumentar os impostos, restringir o crédito e reduzir as despesas orçamentárias.
Mas a inflação continua de maneira avassaladora, a produção diminui e surge o desemprego.
O governo só agiu com rapidez e eficiência na modificação da lei de remessa de lucros, que vinha não em interesse da economia nacional e sim em benefício do capital estrangeiro.
Deu o Brasil algum passo à frente, depois do movimento de abril, para a sua libertação nacional?
Aí estão os fatos para comprovar a realidade econômica e política. Só se verifica o recuo, o retrocesso. Nenhuma medida foi tomada seriamente para a efetivação das reformas e melhoria do país e do povo.
A chamada revolução não fez outra coisa senão deter a revolução brasileira.
Evidentemente, nada se poderá fazer numa nação atemorizada. A democracia não é apenas uma conquista moral que garante os direitos do homem, necessários à própria dignidade de viver. A democracia é também uma conquista histórica da natureza objetiva no campo político e social.
Não é possível realizar nenhuma reforma, no Brasil, o livre debate, sem a plena liberdade de pensamento. Nada se fará de positivo, desde que haja constrangimento, coação e temor.
E por que o Ato Institucional? Por que a supressão das liberdades públicas? Por que a cassação dos direitos políticos? Por que a suspensão das garantias constitucionais?
O que se verifica, atualmente, é uma liberdade consentida, mas não a plena liberdade assegurada pela Constituição de 1946.
Não resta dúvida: se as reformas forem levadas ao Congresso e aprovadas, neste ambiente de terror, correrão o risco de não passar de letra morta. O essencial não é a votação de uma lei e sim a transformação da estrutura social para dar ao país a sua emancipação econômica.
O processo de desenvolvimento econômico como o da democratização política foram interrompidas no País com o movimento de abril. Mas não se muda a mentalidade de um povo com medidas administrativas ou a instauração do terror policial e militar. Não se altera uma realidade histórica por meio da força que episodicamente se faz sentir e se impõe.
A história foi sempre assim: dois passados para a frente e um passo para trás. De outra forma, a humanidade não teria chegado ao que chegou presentemente.
O eclipse da democracia brasileira não quer dizer o seu crepúsculo. A redemocratização do país se imporá como a necessidade primordial, inerente à sua própria sobrevivência.
O povo sabe o que representa a liberdade. E nunca a liberdade é tão querida e tão desejada como na hora em que se encontra em perigo.
A vida política do país está em ameaçada pelos civis e militares da direita, que continuam a conspirar para impedir que o Brasil possa reencontrar o caminho de sua verdadeira revolução.
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