O pior livro de 2013 está prestes a ser lançado: Mensalão, de Merval Pereira.
Cuidado, pois.
Tratando-se de Merval, não poderia ser outra coisa que não a reunião
de seus artigos maçantes e previsíveis ao longo do julgamento. Conteúdo
novo? Talvez na próxima. Merval provavelmente pagou um mensalinho a um
estagiário para compilar os artigos e vamos ficando por aí.
O livro é revelador, não obstante.
Ele mostra a relação incestuosa entre a Globo (e a grande mídia) e o
STF. O prefácio é de Ayres Britto, que presidia o Supremo durante o
Mensalão.
Pode? Pode.
É legal? É.
É eticamente aceitável? Não. Exclamação.
O pudor deveria impedir o conúbio literário entre Merval e Britto.
Mas o pudor se perdeu há muito tempo. Em outra passagem amoral desse
caso de amor entre mídia e justiça, o ministro Gilmar Mendes compareceu
sorridente, em pleno julgamento do Mensalão, ao lançamento de um livro
do príncipe dos escaravelhos Reinaldo Azevedo em que os réus eram
massacrados.
Ali estava já a sentença de Gilmar.
Pilhados por uma câmara indiscreta, Azevedo se gabou da presença
ilustre, aspas, do companheiro Gilmar, e este seguiu em seu caminho de
defensor da justiça e da causa do 1%.
A decência e o interesse público mandam distância entre os dois
poderes, a mídia e a justiça. Na Inglaterra, se o juiz Brian Leveson,
que comandou as discussões sobre a mídia e seus limites, confraternizar
com um jornalista, a carreira de ambos estará encerrada.
No Brasil, é pena, isso não é bem assim.
Conheço Merval há anos. Quando eu começava carreira na Veja, ele foi,
durante algum tempo, editor da seção de Brasil. Não virou manchete,
porque não tinha elegância ao escrever, o que naquela época era um
requisito na Veja.
De lá voltou a seu habitat, o Rio. Seu tento mais espetacular, nestes
anos todos de regresso ao Rio, foi ter matado Hugo Chávez numa coluna
que, não gozasse ele da imunidade de porta-voz do patrão, podia ter lhe
custado a mensalidade que recebe. Seu mensalão, enfim.
Reencontrei-o quando fui integrante do Conedit, Conselho Editorial das Organizações Globo.
Rapidamente, nas reuniões semanais de terça-feira no Jardim Botânico
conduzidas por João Roberto Marinho, me impressionei com Merval e Ali
Kamel.
Não pelo talento, não pelo brilho. Mas pela capacidade de reproduzir,
alguns tons acima, tudo que a família Marinho pensava. Pareciam
competir entre si, como se dissessem: “Eu concordo com o João mais do
que você!” (Acho graça quando atribuem poder ideológico a Kamel: se seu
patrão fosse progressista, ele seria progressista e meio. Ele não
formula intelectualmente, e sim executa jornalisticamente o que os
Marinhos desejam. Embora seus amigos da Veja dediquem espaço monumental à
resenha de seus livros em troca de ampla cobertura da revista no JN,
nenhum deles tem qualquer valor literário.)
Aquilo tudo no conselho evidentemente me incomodou. Uma vez, depois
de uma reunião, fui almoçar com Luiz Eduardo Vasconcellos, sobrinho de
Roberto Marinho, acionista minoritário do Globo e integrante do Conselho
Editorial.
O cardápio, olhando para trás, foi suicida, para mim. Não conversei,
desabafei. Disse a Luiz Eduardo, um bom sujeito aliás, que me chamava a
atenção na reunião o fato de todos os participantes repetirem, basicamente, as ideias da família Marinho.
Onde alguma diversidade, onde algum esboço de pluralismo?
Alguns macaqueavam mais discretamente, outros com exuberância e
estridência retórica. Era este o caso de Merval e de Kamel. Minha
solidão naquele grupo era imensa, era universal, e não apenas por eu ser
de São Paulo.
Merval, em seus artigos, se coloca como um Catão. Talvez um dia nosso
Catão possa vir à luz do sol para explicar por que, trabalhando há
tantos anos para todas as mídia da Globo, é um PJ – um artifício pelo
qual ele e seu empregador pagam menos impostos do que deveriam, e ainda
se concedem o direito de fazer sermões sobre moral.
Nenhum comentário:
Postar um comentário