13/02/2014
Por Mauro Santayana
(JB) - Se há uma coisa que muitas vezes, impressiona, em certos
segmentos da elite e do empresariado nacional, é a facilidade com que se deixam
pautar e manipular pela imprensa estrangeira – e seus replicantes locais – sem entender
que por trás de tudo que não seja absolutamente factual, existem determinados interesses.
Esse é o caso, por exemplo, dos artigos e “análises” feitas pela mídia, a respeito da Aliança do Pacífico, que engloba
o México, a Colômbia, o Peru e o Chile, e que reuniu-se há alguns dias, em Bogotá,
proclamando retumbantemente o corte de 92% das tarifas no comércio entre seus
sócios.
A AP está sendo apresentada, dentro e fora do Brasil, como o
último prego no caixão do Mercosul, do ponto de vista econômico, e como a aliança
que servirá de alternativa – principalmente, ideológica – para os diferentes
mecanismos de integração – como a UNASUL e o Conselho de Defesa – que estão sendo
promovidos pelo Brasil em nosso continente neste momento.
Em primeiro lugar, é preciso lembrar, Colômbia, Peru e Chile,
longe de serem contra o Mercosul, são membros associados da organização – o
México tem status de observador – e também da UNASUL e do CDS, o Conselho de
Defesa Sul-americano. E o Chile, a partir da posse da presidente eleita Michelle
Bachelet, tende se reaproximar do Brasil
e do próprio Mercosul.
Acreditar que o Brasil vai perder para o México esses parceiros
– com quem dividimos até projetos militares - é ignorar o fator geográfico, e
esquecer que já dispomos de acesso facilitado a esses mercados, privilégio que
não poderá ser alterado, sob a pena de essas nações também terem seus produtos
barrados no mercado brasileiro, o maior das Américas, depois dos Estados
Unidos.
Em segundo lugar é preciso relativizar a importância da AP,
lembrando, por exemplo, que só o Brasil tem uma economia maior do que a de
todos os seus membros reunidos.
E que o Mercosul, como um todo, com a recente inclusão da
Venezuela, e um PIB total de 3.3 trilhões de dólares, representaria, se fosse
uma nação, a quinta maior força econômica do mundo.
Por trás do mito da Aliança do Pacífico, existe a ilusão de
um maior dinamismo da economia mexicana, o principal país do grupo – que
cresceu no ano passado 1.2% - com relação à brasileira, a maior do Mercosul –
que avançou 2.5% no mesmo
período.
Existem mais coisas que definem o lugar que o Brasil e o
México pretendem ocupar no mundo – e seus respectivos projetos de
desenvolvimento – do que a mera geografia e o volume de exportações.
O México é um país totalmente integrado à América do Norte,
e, nessa integração, ficou bom em terceirizar mão-de-obra barata, fabricar refrigerantes,
cimento e pão de forma, e prestar serviços de telefonia.
O Brasil é um país integrado à América do Sul e ao BRICS, que
privilegia o crescimento de seu mercado
interno, tem como principal parceiro comercial a China, e vende para todos os
continentes do mundo.
Somos o mais avançado país em pesquisa agropecuária, extração
de petróleo a milhares de metros de profundidade, em alto mar, a centenas de
quilômetros da costa; em desenhar e fabricar aviões civis de passageiros de até
120 lugares. Produzimos mísseis navais e aéreos, foguetes de saturação, radares
e mísseis de cruzeiro.
Dominamos o ciclo do enriquecimento do urânio, fabricamos e
possuímos aceleradores de partículas (o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron
está em funcionamento e vem aí o Sirius, com 165 metros de diâmetro e 650
milhões de reais de investimentos), e estamos aprendendo a fazer submarinos nucleares,
aviões de caça supersônicos e sistemas de transporte a levitação magnética (o Cobra-Maglev
da Coppe), por exemplo.
Na internet, alguns mexicanos gostam de apresentar – ao
contrário de nós mesmos, que não nos arriscamos a fazer o mesmo - como “mexicana”
uma suposta superioridade em manufatura com relação ao resto da América Latina,
que se desmente pelos seguintes fatos:
- A quase totalidade das fábricas instaladas no México são de
outros países – não existe uma única marca mexicana de automóveis ou de bens de
consumo avançados.
- O comércio exterior do México, embora volumoso, é
tradicionalmente deficitário.
- A pesquisa e a engenharia de caráter industrial são majoritariamente
desenvolvidas em outras regiões do mundo.
- Se não fossem os baixos salários e o mercado dos Estados
Unidos do outro lado da fronteira, os mexicanos sequer teriam a sombra do
parque “industrial” que possuem.
E não seriam um país exportador, considerando-se que 90% do
que fabricam, tem como destino o TLCA - NAFTA (Canadá e Estados Unidos).
Trata-se, portanto, de condições, que não seria possível
repetirmos aqui mesmo se quiséssemos - o que não é o caso - ou se viajássemos para a fronteira de Tijuana e
regredíssemos de volta no tempo.
Mesmo quando se considera a indústria automobilística,
paradigma de uma suposta superioridade industrial mexicana com relação ao
Brasil, até mesmo pesquisadores daquele país se recusam a endossar isso.
Esse é, por exemplo, o caso do estudo “Industria Automotriz en México y Brasil: Una comparación de resultados
después de la crisis de 2008”, da Dra.
Lourdes Alvarez Medina, da UNAM – a maior universidade do México, que conclui seu
texto da seguinte forma:
“Respecto a las
características de cada industria se observa que México no ha desarrollado
marcas propias, importa una gran cantidad de autopartes y componentes y no ha
diversificado sus exportaciones ni tiene procesos de innovación importantes.
Depende completamente del mercado de los Estados Unidos y ha descuidado su mercado
interno.
Brasil por su parte
tiene algunos productores locales de autobuses y chasis, tiene una cadena productiva mejor
conformada y en algunos modelos tiene contenido local hasta de 90% y sus
exportaciones automotrices están muy diversificadas y su mercado interno creció
en tiempo de crisis. Además, los autos manufacturados en Brasil consumen
gasolina y etanol en diferentes proporciones lo que le da a la flota vehicular
brasileña cierta independencia del petróleo.”
Com todo o respeito pelo sofrido passado do México, que
perdeu metade de seu território para os EUA, e pelo povo mexicano, sua arte,
cultura milenar e literatura, se me perguntassem, principalmente, hoje, se
preferiria estar no lugar do México ou do Brasil, ficaria – ao contrário do que
muita gente pensa por aqui - na condição em que estamos.
Considerando-se nosso território, população, economia,
capacidade de cooperação e articulação, dimensão e projeção geopolítica, ainda
é preferível ser o principal país da América do Sul, do que um mero apêndice norte-americano.
Blog do Mauro Santayana
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