O site da Vice traz uma longa entrevista de Roger Franchini com o agente federal Rafael Rodrigo Pacheco Salaroli.
Salaroli, ou Pacheco, trabalha na Delegacia de Repressão a Entorpecentes de Vitória, no Espírito Santo, e foi um dos responsáveis pela apreensão de 445 quilos de cocaína no helicóptero do deputado estadual Gustavo Perrella, filho do senador Zezé.
A conversa é boa — mais pelo que não revela, talvez, do que pelo que revela. Aquela foi uma das maiores apreensões de droga do Brasil, na aeronave de uma família poderosa em Minas Gerais. Pacheco declara que cuidou da logística da operação. “Os caras estão lá no mato, ele não tem condição de fazer isso. Então, porra, um colega passou mal, ficou doente, precisa ser substituído, uma viatura quebrou, precisa de dinheiro, precisa de armamento, você tem que ter um cara fazendo essa logística, fazendo isso. Eu fiz isso.”
Explicou como costuma funcionar um esquema desse tipo: “Os caras trabalham em células. Quem fornece não conhece quem transporta, que não conhece quem recebe, que não conhece quem revende. A vantagem disso é que, quando você pega um, o cara realmente não conhece o próximo. E qual é a desvantagem desse tipo de estrutura? O envolvimento de pessoas ‘não profissionais’.”
O piloto Rogério Almeida Antunes, segundo ele, era um irresponsável: “Você não tá pensando como traficante que chega a ganhar um milhão de reais numa operação dessas. Então, quer dizer, os caras da internet não sabem que os pilotos que se dedicam a essa atividade são malucos, ignoram perigos básicos, carregam combustível dentro da aeronave…” Antunes, é bom lembrar, era funcionário de Gustavo Perrella na Assembleia Legislativa de Minas.
E então conta por que os Perrellas foram “excluídos” da investigação em menos de duas semanas: “Já naquela época, tínhamos um monte de detalhes que os excluíam da situação. Agora, além disso, existe um conjunto enorme de mensagens de celular (saiu ontem o laudo, mas não vamos falar delas, OK?) entre o piloto do deputado e outro piloto. Eles conversam sobre o pagamento das horas ao deputado, que acertaram ser apenas 4h, visto que ele disse que iria até São Paulo e voltaria. Seriam dois mil reais a hora. Ocorre que já estavam voando há quase 28h e combinam então de enganar o deputado. Ou seja, o deputado pode ter envolvimento em ilícitos? Pode. Mas com o conteúdo destas conversas fica absolutamente excluída qualquer chance de ligá-lo a este evento.”
Mas e as mensagens entre Gustavo Perrella e Antunes? Ele admite que não as ouviu. “Para você ver. O deputado vai lá e fala: ‘Eu não sabia de nada’. Aí depois ele mexe no próprio telefone e se dá conta que mandou uma mensagem para o piloto. Daí o que ele faz? Dá outra declaração desmentindo a anterior, porque ele sabe que na hora que sair o laudo eu vou ter essa mensagem. Mas se eu mexer nesse telefone antes da autorização judicial, o advogado vai falar: ‘Você conspurcou a prova, portanto, ela não vale mais nada’. Só vou ver essas mensagens quando o perito me entregar o laudo.”
Os policiais estavam com os celulares nas mãos. “Você tem que entender o seguinte: a necessidade de você obter uma informação é até você obter o que você quer. O que eu quero? Provar nosso ponto perante à justiça, curiosidade é coisa de menino”.
E qual é o ponto? Ele mesmo elenca as perguntas que ficaram sem resposta: “De quem é a terra eu já sei, mas por que ele a comprou, qual o real desejo de comprar essa fazenda? É coincidência alguém ter comprado uma fazenda de forma lícita, e uma aeronave carregada de entorpecentes pousa nela dias depois? De quem era essa droga? Quem são os fornecedores? Quem são os financiadores dessa operação?”
Essas questões precisarão de mais esforço para ser respondidas. Isso não é curiosidade de menino.
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